Artigo atualizado em 09/07/2019
Muitas pessoas me questionam o por que de não haver casas no centro velho de São Paulo. Respondo que embora sejam difíceis de encontrar, existem sim casas médias e casarões na região central da cidade, onde já está quase tudo tomado por grandes edifícios. Uma local da Sé que podemos ver algumas casas é a rua do Carmo.
Construída em 1912 e localizada no número 107 desta rua, a casa está um pouco modificada mas ainda assim chama bastante atenção, com elementos originais preservados.
Como grande parte deste tipo de imóvel da região central, este aqui está sobrevivendo como um cortiço ou moradia popular. É um destino que na maioria das vezes não resulta em uma boa perspectiva para a preservação do imóvel. É evidente que aqui não é uma página voltada a comunidades ou a moradia, temos o ponto de vista da preservação do patrimônio em primeiro lugar.
Há uma grande hipocrisia de alguns urbanistas, que ao mesmo tempo que querem preservar os bens tombados, incentivam o uso destes bens para moradia popular. Isto é um grande erro, que mantém muitas das construções históricas particulares em péssimo estado de conservação.
Acho válida a moradia popular na região central, mas não em bens de valor histórico como este. Quem irá arcar no futuro com os custos de preservação de uma fachada original, do frontão, madeiramento da residência e telhados ? O custo disso é altíssimo, sendo oneroso até para proprietários com boas condições financeiras.
A própria restauração da Vila Itororó foi adiada por anos, em virtude das moradias que lá existiam. Modificaram imóveis, criaram anexos (ou puxadinhos), deixaram vitrais e colunas deteriorarem a um ponto em que o restauro ficou ainda mais caro ao governo municipal e seus parceiros (além de nós, contribuintes).
E, sejamos frios e honestos, será que algum proprietário terá interesse em restaurar uma residência como esta para destinar a moradia popular ? Acho que em grande parte dos casos a resposta será negativa.
Voltando a falar desta casa, ela é vizinha do esqueleto da rua do Carmo, uma ruína horrorosa de um edifício inacabado que está por ali há algumas décadas. É difícil dizer o porque do abandono do prédio, mas já escutei de tudo: desde falência do proprietário, até interdição por medida de segurança devido as obras do metrô na década de 70.
Na fachada da residência há duas figuras de crianças que seguram um brasão simples com as iniciais JB, possivelmente dos primeiros proprietários em 1912. Pesquisando sobre o imóvel só encontramos nomes de moradores e/ou proprietários mais recentes, em 1961. São os nomes de Josephina Marins e Luiz Antonio Sonvezzo.
Na fachada da residência, todos os detalhes originais estão preservados, embora necessitem de alguma manutenção. O antigo porão habitável, foi transformado em um cômodo com saída para a rua, através de uma pequena porta aberta na lateral esquerda, diminuindo o gradil que foi parcialmente emparedado.
As alterações mais drásticas se deram no lado esquerdo, onde fica a entrada para o imóvel. O portão originai foi suprimido, dando lugar a uma porta estreita e outra comercial. Sobre elas foi feito um típico “puxadinho” que garantiu mais alguns cômodos ao local.
A rua do Carmo tem grande potencial de revitalização e de turismo, com muitos imóveis antigos – quase todos já citados aqui no São Paulo Antiga – e a famosa igreja Nossa Senhora da Boa Morte. Falta vontade do poder público, interesse de empresários e proprietários e, principalmente: menos demagogia para as políticas públicas de moradia no centro.
Conheça outros imóveis catalogados na rua do Carmo:
- Prédio antigo – rua do Carmo, 71 a 77
- Casarão – rua do Carmo, 81
- Casarão – rua do Carmo, 198
- Sobrado antigo – rua do Carmo, 217
Abaixo uma fotografia do imóvel visto a partir do edifício comercial localizado em frente:
Respostas de 14
Ninguém entende porque não tiram esse esqueleto dali. E o Douglas chama atenção para o óbvio, que tantos de nós temos vergonha de assumir: patrimônio cultural tem importância muito mais abrangente do que moradia popular e pode ser desfrutado, inclusive por quem precisa de moradia popular. Chega de hipocrisia barata e de moralismo jacobino.
Estou averiguando o histórico deste esqueleto, em breve trarei novidades
Não vejo a hora ! Desde 1970, pouco mais ou menos, que vejo aquela tranqueira alí. Nesse tempo ouvi muitas versões, desde embargo da obra, colunas tortas, áté suicídio do dono. Agora despertou-me, novamente, a curiosidade. Aquele imóvel pertence à jurisdição do 4º Registro de Imóveis, se não me engano, talvez lá haja haja algum registro de incorporação.
A rua do Carmo me remota a década de 60, quando trabalhava na extinta TV Excelsior canal 9, lá num dia de domingo, conheci uma bonita moça, que trabalhava no “Rei dos botões” que ficava na rua do Carmo, não sei se ainda existe.
Bom dia Douglas!
Há muito tempo acompanho o trabalho realizado pela “São Paulo Antiga”, sempre admirei muito as iniciativas e realizações. Entretanto, esta publicação me incomodou um pouco quando você fala sobre a moradia popular em bens tombados e acredito que a questão não é apenas financeira como você colocou.
Por muitas vezes, foram feitas publicações neste site sobre os imóveis de valor histórico bem conservados, ou por estar sendo utilizado como uma loja (comércio em geral), um escritório, ou mesmo como moradia; temos exemplos de pessoas que valorizam este patrimônio e o fazem permanecer “vivo” mesmo com o passar do tempo.
A preservação de um bem de valor histórico está diretamente associada ao reconhecimento dele pela comunidade, pela influência destes espaços na vida das pessoas, caso contrário, se não se conhece a história, se não tem associação sensitiva ou se este lugar não funciona para o ‘meu’ bem estar, não tenho porque valorizá-lo, certo? Este assunto é amplamente discutido em cartas patrimoniais que podemos encontrar no site do IPHAN e CONDEPHAAT.
A questão da moradia social entra associada a esta perspectiva. Acredita-se que atualmente no Brasil exista um déficit habitacional maior que 7,2 milhões de moradias (MINISTÉRIO DAS CIDADES,2007) e em contraponto a isto, encontramos nas regiões centrais das cidades cerca de 4,5 milhões de moradias ociosas, entre bens históricos sem usos e edifícios inacabados (como este da foto), isto corresponde a mais de 60% da falta de casas próprias.
Dessa forma, a associação Bem Histórico e Moradia Social propõe a solução do problema de ambas as partes. Não adianta um imóvel ser preservado, restaurado, bem cuidado, se as pessoas não derem a ele um valor significativo, a beleza estética e a questão histórica não atingem a todos. Da mesma forma, não adianta a elaboração de programas de moradia social nas periferias, longe do trabalho, longe do comércio, da infraestrutura urbana, as pessoas necessitam viver a cidade.
Assim, acredito que os atuais Planos de Reabilitação dos Centros Urbanos apresentam propostas fantásticas visando, inicialmente, o cumprimento de itens estabelecidos na legislação federal (como por exemplo: “erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais”; “ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem estar de seus habitantes”; “o uso da propriedade urbana em prol do bem coletivo, da segurança e do bem‐estar dos cidadãos, bem como do equilíbrio ambiental.” entre outros) constantes principalmente na Constituição Federal de 1988 e no Estatuto da Cidade (Lei nº 10.257 de 2001); chegando até a capacitação da mão de obra para restauro e educação patrimonial, de forma a garantir a preservação dos bens históricos, a diminuição dos custos dos projetos de restauração e proporcionando empregos as pessoas de baixa renda que também tem o direito de morar nos centros.
Pode parecer hipocrisia, mas enquanto o cidadão brasileiro continuar a procurar soluções que divergem dos ideais de nosso país, de nossa legislação e continuar a aplicar o famoso “jeitinho brasileiro” nunca iremos ver uma sociedade melhor, sem desigualdades e sem preconceitos.
Mais uma vez parabenizo pelo o trabalho desenvolvido e agradeço a oportunidade de expor aqui algumas informações para contribuir ao entendimento da cidade.
Obrigada e até a próxima!
Victoria, como vai ?
Eu sou favorável a moradia popular no centro, de forma mista, com todas as classes misturadas. Sou contrário a guetos de toda espécie (de ricos, pobres ou classe média).
O que eu sou contrário é que imóveis históricos, ou de importância para preservação, sejam moradia popular. Posso te mostrar alguns exemplos de prédios antigos – de manutenção dispendiosa – que viraram moradia popular no centro de São Paulo e estão se transformando em prédios mal cuidados e cheio de problemas. Um deles é o antigo hotel São Paulo, mas tem dois exemplos memoráveis sendo um na 23 de Maio e outro na avenida Prestes Maia, perto do Mirante do Vale.
Abraços
Prédios, de uma maneira geral precisam de manutenção quase que periódicas, e se tiverem elevadores então, precisam (por lei) contratar uma empresa que façam as manutenções adequadas e isso não é barato, resumindo, tudo isso é rateado entre os moradores que já sabemos, não gostam de pagar nada…querem tudo de graça do governo. Sem falar na limpeza, necessitando contratar um faxineiro, porteiros, zeladores coisas que os “´populares” desconhecem, na verdade, eles não tem uma educação adequada para morar em prédios, pois no fim, acabam virando uma favela, até com riscos de incêndio. E mais, “populares” no centro de São Paulo? Ah! estão querendo transformar nosso já sujo e desorganizado centro em um cortiço a céu aberto. É minha opinião sem hipocrisia.
Sua opinião sem hipocrisia e carregada de preconceitos!
Douglas, acompanho o seu trabalho há algum tempo e também acho que o centro da cidade deve ser repovoado por todas as camadas sociais. Em relação aos prédios suntuosos do passado como o antigo Hotel São Paulo que mencionou, a solução óbvia e simples para isso é destinar estes prédios a quem pode pagar para morar neles, ou seja, os segmentos de média e alta renda. Há prédios desocupados no centro para todos os gostos e bolsos, basta apenas vontade política para transformá-los em habitação. Não é porque as pessoas são pobres que suas casas ou apartamentos são um chiqueiro, eu mesmo sou pobre com orgulho e nem por isso minha casa é assim, inclusive estou de mudança para um prédio na Cohab José Bonifácio que é muito limpo e bem conservado por sinal. “A gente diferenciada” é muito mais parecida com o restante da população do que se imagina.
Emerson, concordo com você, mas discordo num ponto, pois acho bem difícil alguém de classe média ou alta querer morar no centrão.
Ao tomar conhecimento hoje, sobre o castelinho da rua apa, o qual achei ótimo, um dos melhores do site, apenas não consegui deixar uma resposta, pois não achei como. Pena. Tambem, não era nada importante, era apenas uma observação sobre o comentário de um cidadão que dizia que se tivesse dinheiro, ia comprar e construir um cinema e um rinque de patinação. Eu ia sugerir a ele, que se sobrasse espaço, fizesse tambem uma rodoviária e um aeroporto, ao lado de um shopping.
As casas são bonitas, mas o triste é que o centro de São Paulo já há tempos vem sendo prejudicado por obras mal feitas e/ou mal planejadas que acabaram degradando a região ao longo dos anos.
Prezado Douglas, poso pedir sua ajuda? Preciso localizar qual é o atual nome da antiga Rua Luiza LIma em 1.913, provavelmente nos arredores da Av. Angélica.
Obrigado.
Olá Ronaldo, me dê uns dias para averiguar. Abraços