Sociedade Industrial e de automóveis “Bom Retiro”

Em nossos estudos sobre a região de entorno da Praça Ramos de Azevedo e Theatro Municipal, descobrimos diversas construções interessantes erguidas entre o final do século 19 e início do século 20 cujos registros são raros e suas histórias, desconhecidas. É o caso do suntuoso Palácio do Trocadero, da residência de José Paulino e do extinto Palais Elegant. Todos eles já demolidos no decorrer do século XX e igualmente localizados ao longo da Rua Conselheiro Crispiniano.

Hoje prosseguimos com nossa pesquisa trazendo aqui outra construção praticamente desconhecida dos paulistanos, localizada no então número 12 da Rua Barão de Itapetininga.

Fotografia 1 – Rua Barão de Itapetininga em 1920 (clique na foto para ampliar)

Este interessante e eclético imóvel comercial foi construído no limiar do Século XX no local que outrora existiu a residência de Bento José Fernandes e serviu de diversas funções, sendo as mais notáveis o Cine Scala, Cinema Brazil (em 1915) e, finalmente, a Sociedade Industrial e de Automóveis Bom Retiro.

Esta última empresa foi a que por mais tempo permaneceu no local, até meados da década de 1930, quando este imóvel foi demolido para dar lugar ao futuro Edifício Itá (inaugurado em 30 de junho de 1939).

Neste endereço a Sociedade Industrial e de Automóveis Bom Retiro tinha uma de suas filiais, cujos demais endereços estavam espalhados pela região central paulistana na Rua Direita (matriz), Largo de São Francisco e Rua Júlio Conceição, no Bom Retiro (oficinas).

Fundado em 1911, o estabelecimento também era conhecido pelo nome “Casa Ford” uma vez que era o principal representante da fabricante no Brasil nos primeiros anos da Ford no país. Outras marcas comercializadas por eles eram Briscoe, Essex e Hudson.

publicidade de 1912 (clique para ampliar)

A empresa não era apenas uma concessionária automotiva e também atuava na produção de outros produtos, como arames para aplicações residenciais e para a construção de cercas. Para estes produtos era utilizada a marca “Page”, bastante conhecida dos paulistanos nas duas primeiras décadas do Século XX e destaque na Exposição Industrial da Cidade de São Paulo do ano de 1917.

Em 1916 a empresa foi uma das principais patrocinadores do Primeiro Raid São Paulo <-> Ribeirão Preto, prova automobilística entre as duas cidades e que antecedeu em 20 anos ao primeiro Grande Prêmio de São Paulo.

Em algum momento da segunda metade anos 1920 a Sociedade Industrial e de Automóveis “Bom Retiro” passou a trabalhar com dificuldades financeiras, muito possivelmente pelo aumento da concorrência no setor de veículos, com a abertura de diversas outras revendas de veículos tanto da Ford quanto de outras marcas. A empresa teria sua falência decretada em 29 de maio de 1930.

Fotografia 2 – O interior da loja, com um veículo em exposição, em 1920 (clique para ampliar)

NOTA:
*1 – Não foi possível identificar em que ano a Sociedade Industrial e de Automóveis Bom Retiro instalou sua loja na Rua Barão de Itapetininga, nosso palpite é algum momento entre 1918 e 1920.

CURIOSIDADE:

A fotografia abaixo mostra com mais precisão onde ficava exatamente a antiga construção da Rua Barão de Itapetininga, 12 (atual número 88). Conforme mencionado no começo deste artigo ali está desde 1939 o Edifício Itá, que é bem conhecido pela sua galeria comercial no térreo e também por abrigar a Livraria Calil, o mais antigo sebo paulistano fundado em 1945 e que está instalado no nono andar.

Fotografia 3 – Rua Barão de Itapetininga no final da década de 1920

Outra imagem interessante para complementar este artigo é a planta do cinematógrafo. Nele é possível ver o peculiar desenho da fachada mourisca desta edificação.

clique na imagem para ampliar

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA:
* O Brasil no Iº Centenário de sua Independência, Monte Domecq & Cia, 1920 – pp 272
* A Ilustração Paulista – Edição 0058 / 1912 – pp 22
* A Vida Moderna – Edição 0318/1917 – pp 2
* A Gazeta – Edição de 31/05/1930

Artigo atualizado em 10/03/2021 – Inserida imagem da Rua Barão de Itapetininga (fotografia 3) e planta da fachada principal do cinematógrafo.

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Respostas de 14

  1. Excelente matéria, Douglas, como sempre, aliás, como sugestão de pauta, que tal escrever sobre a roda dos enjeitados, que havia em hospitais como a Santa Casa e onde eram entregues crianças para adoção?

  2. Douglas, o edifício Gloria de 1928 que fica na esquina da praça Ramos de Azevedo não é este da foto atual, este edifício que existe no local atualmente é da década de 60 ou 70.

    1. Olá, você está enganado. O Prédio Glória é esse mesmo, ele tem entrada na Rua Cons. Crispiniano mas é em formato de “L” e vai até a Barão… se vc reparar bem na foto o prédio não tem entrada, justamente pq a entrada está na outra rua. O da esquina é outro, não mencionei ele. Mas na época o terreno era um só, como é possível ver na foto de 1921.

  3. Que delícia é ler esses esclarecimentos da história da nossa querida São Paulo e ainda ver tantas fotografias de uma época mágica que passou…

  4. Grande site, belo trabalho com todos os registros que pude ler até aqui. De grande relevância para quem tem um passado íntimo com S. Paulo.
    Lhe perguntaria, você conhece algum trabalho semelhante ao seu retratasse a cidade do Rio de Janeiro?
    Grato.

  5. Nesse momento de fechamento de fábricas da Ford, importante manter um pouco da história automobilística brasileira. Parabéns Douglas e equipe!

  6. Na planta do cinematógrafo, está escrito “kinema”. Vai saber…
    Consta-se que o famoso Sebo Ornabi também foi aberto em 1945, na região da Sé.

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