Muitas vezes quando passeamos pela Avenida Paulista, um dos belos cartões postais da Cidade de São Paulo lamentamos os inúmeros casarões que foram demolidos nesta via.
O mais recente a sucumbir foi a residência de Dina Brandi Bianchi em 2011. Mesmo assim, alguns poucos casarões resistem à ganância sem fim das grandes construtoras.
O que nem sempre notamos é que na via paralela à avenida Paulista, a Alameda Santos, também existem alguns poucos imóveis antigos, alguns deles centenários que precisam ser preservados, mas correm sério risco de demolição. Um deles é o “Casarão dos Bocaina”.
MAS MOROU MESMO UM BARÃO ALI ?
Coloquei o nome “Casarão dos Bocaina” em aspas por uma razão simples. Não há evidências de que Francisco de Paula Vicente de Azevedo, o Barão da Bocaina, tenha residido neste imóvel.
Na verdade, os indícios apontam que apenas um de seus filhos tenha vivido ali, cujo nome também foi Francisco de Paula Vicente de Azevedo, este por sua vez, sem título de nobreza.
Através de pesquisas detectamos que o Barão viveu no bairro de Campos Elíseos e não na região da Avenida Paulista. Aliás é uma lenda de que os casarões da paulista pertenceram aos Barões do Café.
Na Paulista residiam os empresários e industriais, a grande maioria imigrantes bem sucedidos. Apenas dois cafeicultores residiram na avenida, e apenas uma pessoa com título de nobreza imperial, a Baronesa de Arary. Vale lembrar que os Condes Rodolfo Crespi e Matarazzo não eram condes nomeados pelo império, eles eram condes papais.
Em 1911, quando a casa foi inaugurada, celebrou-se o casamento do filho Barão da Bocaina com Cecília Galvão, filha de Carlos Correa Galvão. Por ter sido no mesmo ano da inauguração da casa, é bem possível que a mesma nunca tenha abrigado um barão, apenas o filho dele. O Barão faleceu em 17 de outubro de 1938.
Portanto é bastante improvável – mas não impossível – que o Barão da Bocaina tenha residido ali. Prosseguiremos com as pesquisas.
OS MORADORES
O empresário Dr. Francisco de Paula Vicente de Azevedo residiu nesta casa a vida toda juntamente com sua esposa, Cecília Galvão Vicente de Azevedo, e sua filha única, Maria Cecília Vicente de Azevedo, e puderam acompanhar toda a transformação da região.
Ele, diplomado pela Faculdade de Direito do Largo São Francisco, foi agricultor e industrial tendo sido um dos pioneiros da indústria de papel no Brasil como fundador da fábrica de Cubatão.
Foi também fundador da União dos Fabricantes de Papel e secretário da fazenda do Estado de São Paulo. A esposa morreu em 1974 e ele dois anos depois em 14 de agosto de 1976.
Após a morte dos pais, Maria Cecília Vicente de Azevedo respeitou o desejo do pai e manteve o casarão, não cedendo jamais a especulação imobiliária.
Ela viveria no casarão até falecer em 2007 aos 93 anos de idade. Como nunca casou-se e não possuia filhos, os bens pertecentes a ela foram dividos entre os demais familiares e o casarão, infelizmente, acabou vendido para uma incorporadora.
O CASARÃO
A residência centenária é uma das mais belas construções a resistir na região da Avenida Paulista e arredores. Construção eclética possui dois pavimentos e uma bela entrada com colunas jônicas, além de um jardim encantador que mesmo estando alguns anos largado continua belo. A casa mantém ainda os muros e portões baixos originais e apresenta-se em excelente estado de conservação.

Riqueza de detalhes da fachada e das colunas impressiona
Esta construção de valor histórico incalculável para a Cidade de São Paulo corre risco de vir abaixo. A proprietária do imóvel, a incorporadora Stan, entrou com pedido de demolição para erguer uma novo empreendimento no local, desprezando a história do imóvel e sua importância para a memória arquitetônica da cidade.
Até o momento, não conseguiu a autorização necessária pois houve uma movimentação para pedir o tombamento do imóvel pela Sociedade dos Amigos e Moradores do Bairro de Cerqueira César (Samorc).
Entretanto enquanto a decisão final não sai, o casarão está largado à própria sorte. É possível notar que há algum interesse pela rápida deterioração do imóvel, uma vez que apuramos que as janelas do andar superior ficam o tempo todo abertas, faça chuva ou faça sol (veja fotos no final da galeria). Isso facilita a entrada de água, sujeira e também acelera a degradação, uma vez que a umidade no imóvel pode se acelerar.
Além disso, não é possível saber se internamente está tudo sendo conservado como se deve. Como o interesse é demolir o casarão, não acredito em preocupação com o imóvel.
Será que o destino de mais um casarão histórico é vir abaixo ? Ou podemos confiar no bom senso do CONPRESP ? Estamos de olho.
Triste cidade esta onde todos os dias sua memória é desprezada e insultada por construtoras e incorporadoras.
Veja mais fotos do “Casarão dos Bocaina” (clique na miniatura para ampliar):
Curiosidades:
- O Imperador D. Pedro II concedeu o título de Barão da Bocaina a Francisco de Paula Vicente de Azevedo em 07/05/1887.
- Após a Proclamação da República o Barão da Bocaina retirou-se da vida política dedicando-se então apenas a lavoura e ao comércio.
- Falecido em 1938, o Barão da Bocaina foi o último titular do Império do Brasil a falecer.
- O outro filho do Barão e irmão de Francisco Vicente de Azevedo, o médico Geraldo de Vicente de Azevedo, residia em um casarão em Higienópolis. Existe até hoje e fica na rua Piauí, ele já foi catalogado pelo São Paulo Antiga, clique aqui para conhecer.
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