A história da Viação Cometa

Aqui no São Paulo Antiga sempre recebo pedidos de leitores para contar histórias de empresas que marcaram ou ainda marcam o nosso cotidiano. São companhias das mais variadas linhas de negócios que são lembradas com muito carinho por ex-funcionários, fãs e pesquisadores. E aqui contarei a história de uma empresa que eu mesmo sempre tive muita admiração e carinho: a Viação Cometa.

A trajetória dessa icônica empresa paulistana que se espalhou por todo o Estado de São Paulo se inicia na distante década de 1930 e curiosamente começou para ajudar um outro negócio de seus fundadores que não estava sendo bem sucedido.

Corria o ano de 1937 quando o agrimensor Arthur Brandi e seu cunhado o aviador italiano major Tito Mascioli se tornaram sócios em um empreendimento imobiliário no então distante Jabaquara, região sul da capital paulista. O loteamento não estava deslanchando e a dupla avaliou que a distância e a dificuldade das pessoas em se locomoverem até o bairro era um grande obstáculo para a venda dos lotes. Assim sendo Mascioli decidiu por abrir uma linha de ônibus entre a praça da Sé e o Jabaquara por meio de concessão pública. Nascia ali a Auto Viação Jabaquara S.A embrião da futura Cometa.

Tito Mascioli, de costas junto ao tripé, em imagem da inauguração da A.V. Jabaquara em 1937.
Detalhe para a frota exclusivamente Mercedes-Benz (clique para ampliar)

Se realmente a criação da viação ajudou a vender os terrenos não sabemos, contudo é sabido que abrir uma empresa de ônibus foi um negócio extremamente bem sucedido para a dupla de cunhados, sendo que com o tempo a Auto Viação Jabaquara chegou a ser responsável por quase metade do transporte coletivo da capital paulista, o que levou a Mascioli ser alçado a um cargo no setor de transporte coletivo da prefeitura municipal, que posteriormente se transformaria na lendária CMTC.

O transporte urbano de passageiros seja de bonde ou ônibus em São Paulo não era uma maravilha, existiam problemas de poucas linhas, poucos veículos, superlotação e a baixa qualidade de algumas viações, o que levou em 1947 a CMTC a encampar as linhas de ônibus da cidade, entre elas as pertencentes à Viação Jabaquara. Mesmo sendo tesoureiro da estatal, Mascioli não foi indenizado pelas linhas perdidas e teve que repensar as atividades, dedicando-se ao transporte rodoviário.

Publicidade da Viação Cometa – Década de 1950

A empresa começa a adquirir outras companhias de ônibus para ampliar seus serviços e o nome cometa surge em 1948, pouco depois da empresa ter adquirido a Auto Viação São Paulo-Santos Ltda cujo emblema era um cometa em formato de estrela cadente, que serviu de inspiração para o logotipo da Viação Cometa.

A partir da década de 1950 a empresa tem grande expansão, com novas aquisições de companhias menores e novas linhas, como “São Paulo – Jundiaí”, “São Paulo – Sorocaba” e “São Paulo – Campinas”. Em dezembro de 1951 inicia sua história nas viagens interestaduais pouco depois da inauguração da rodovia Presidente Dutra, com a estreia da linha “São Paulo – Rio de Janeiro”.

Na foto os ônibus Twin Coach aguardam a liberação do tráfego em novo trecho pavimentado da Rodovia Presidente Dutra (clique para ampliar)

A entrada de outras empresas nas linhas entre São Paulo e Rio de Janeiro força a empresa a ampliar a frota para enfrentar bem a concorrência. É neste período que a empresa compra da General Motors, nos Estados Unidos, 30 ônibus modelo PD-4104, bastante modernos para a sua época com carroceria em alumínio, suspensão a ar, ar condicionado e o forte motor Detroit-Diesel 6-71 de 211 cavalos.

Nesta mesma década a Cometa adquire a empresa de ônibus urbano de Campinas, Viação Lira. Da junção dessa empresa com outra do grupo surge a também famosa CCTC (Companhia Campineira de Transporte Coletivo).

Na foto a oficina da Viação Cometa em meados da década de 1950 (clique para ampliar)

A ERA SCANIA

Na década de 1960, especificamente em 1964, surge o famoso ônibus Papo Amarelo que era montado pela Ciferal sobre chassi Scania B-75. Era o início da famosa parceria Cometa-Scania que marcaria a trajetória da empresa por praticamente meio século. Foi neste período que diversos ônibus marcantes da companhia paulistana surgiram, como o Flecha de Prata e Flecha Azul, hoje alvos da cobiça de colecionadores por todo o país.

Na foto um dos ônibus Scania com carroceria Ciferal da Viação Cometa (clique para ampliar)

Nesta era da parceria com a Scania a empresa também adquiriu veículos de outros fabricantes, sendo o mais lembrado o famoso monobloco O-326 HL da Mercedes Benz, além de modelos sucessores como o O-355.

Os ônibus com carroceria em alumínio foram tomando conta da frota, especialmente na década de 1970. Já na década seguinte todos os ônibus da Viação Cometa eram de alumínio, uma característica marcante da empresa e que até hoje é lembrada por pessoas que viveram aquele período.

OS ANOS 1980 EM DIANTE

Os anos 1980 marcam mudanças nas operações da Cometa. É neste momento que a empresa decide parar com longas distâncias e atuar apenas em linhas dentro de um raio de 600 quilômetros. A medida serve para melhorar a relação custo-benefício, contudo a linha “Curitiba – Belo Horizonte” fica como exceção por ser muito lucrativa e passa a ser operada com parceria da Impala Auto-Ônibus.

Em 1983 e 1988 a empresa encerra suas operações urbanas (coletivos) respectivamente nas cidades de Ribeirão Preto, onde atuava com o nome Viação Cometa e em Campinas onde mantinha o nome CCTC.

O ex-presidente da FIFA, João Havelange, foi acionista e diretor da Viação Cometa

Já no século 21, precisamente em 2001, a empresa tem mudanças sua administração. Um dos herdeiros de Tito Mascioli sai da sociedade, abrindo assim o caminho para que a Viação Cometa fosse adquirida pelo Grupo JCA, controlador de outras grandes empresas como Catarinense, Rápido Ribeirão Preto, Expresso do Sul, 1001 entre tantas outras. JCA são as iniciais do fundador do grupo, o itaboraiense Jelson da Costa Antunes (*9/11/1927 +31/7/2006).

A entrada do Grupo JCA na vida empresarial da Viação Cometa foi fundamental para uma renovação na empresa paulista, que modernizou-se e passou a contar com investimentos do grupo controlador. Atualmente a Viação Cometa possui linhas para seis Estados do Brasil e também para o vizinho Paraguai.

A CMA

Com as carrocerias dos ônibus da Viação Cometa sendo produzidos pela hoje extinta Ciferal a empresa se viu em maus lençóis na década de 1980 quando a fabricante de carrocerias entrou em crise financeira, cujo início foi o cancelamento da aquisição de cerca de 2000 ônibus elétricos por parte da CMTC.

Antes do baque do cancelamento da CMTC a Ciferal já vinha deixando de produzir carrocerias Dinossauro para Cometa. Isso levou a viação paulistana a tomar uma decisão ousada de criar uma encarroçadora própria, a CMA (Companhia Manufatureira Auxiliar). Para montar os ônibus customizados da Cometa a empresa levou diversos profissionais da Ciferal para trabalhar.

Na foto a milésima carroceira produzida pela CMA (clique para ampliar)

A CMA foi importantíssima para a Cometa pois além de produzir as próprias carrocerias para a viação paulistana, produzia também peças de reposição para ônibus de outras companhias. A encarroçadora encerrou suas atividades em 2009.

EMPRESA CONTA COM MEMORIAL

Uma empresa com tanta história não poderia deixar de contá-la ao público. E foi pensando nisso que a Viação Cometa inaugurou, em 2009, o Centro de Memória Ivan Comodaro, onde estão expostas inúmeras imagens, objetos e memorabilia que marcaram sua trajetória.

Na foto vista parcial do centro de memória da Viação Cometa

Entre as peculiaridades do centro de memória destaco a antiga sala da presidência, preservada em seus mínimos detalhes. Um ônibus Flecha Azul absolutamente preservado e totalmente funcional também faz parte do acervo ficando guardado na garagem da empresa e sendo exibido em eventos e ocasiões especiais.

O museu foi palco de uma reportagem deste mesmo autor para o jornal Folha de S.Paulo e pode ser conferido na íntegra clicando aqui. Infelizmente o espaço ainda não é aberto ao público.

GALERIA DE FOTOS

Compartilhe este texto em suas redes sociais:
Facebook
Twitter
WhatsApp
LinkedIn
Siga nossas redes sociais:
pesquise em nosso site:
Cadastre-se para receber nossa newsletter semanal e fique sabendo de nossas publicações, passeios, eventos etc:
ouça a nossa playlist:

A história das Polacas

Silêncio, preconceito e exploração sexual da mulher em São Paulo através da história das polacas e da origem da Sociedade Feminina Religiosa e Beneficente Israelita.

Leia mais »

26 respostas

  1. Por algum tempo a Viação Cometa manteve um ponto inicial de ônibus com destino a Santos e vice-versa com grande movimentação no Sacomã, Ipiranga, SP…… Gostaria de saber se tens fotos da época daquele local….. eu morava na Rua Bom Pastor, e o ponto ficava na Rua Greenfield com Costa Aguiar……. Obrigado……

  2. Em dezembro de 1976, eu fui com meus pais e irmãos para o casamento de uma prima em Jundiaí. Fomos e voltamos com a Cometa!
    O ônibus saiu da estação Júlio Prestes e eu fiquei maravilhado com a Estação e com todo aquele colorido em especial…mas isso é outra história!
    Quanto ao veículo da Cometa, nem precisdo dizer que também me marcou muito pelo fato de ser a primeira vez que entrei num ônibus de viagem!Eu tinha 7 anos.
    O sr. Ivan Comodaro deve ser alguém de suma importância na história da Cometa para merecer um museu com o seu nome!
    Será que a direção pensa em abrir o referido ao púlico?

  3. A Viação Cometa foi a empresa que criou o transporte rodoviário por ônibus como o conhecemos hoje em dia. Considero o Dinossauro o primeiro ônibus rodoviário contemporâneo do Brasil, pois ele foi a base de tudo que viria a ser introduzido no setor nas décadas seguintes; inclusive, foi com o Dinossauro (inicialmente, exclusivo da Cometa) que, anos depois, a Itapemirim criou o primeiro ônibus de três eixos do Brasil, o Tribus. Aliás, foi a Cometa que introduziu o ônibus com suspensão a ar no Brasil, em 1954 com os carros GMC PD-4104 “Morubixaba” (iguais aos das gigantes norte-americanas Greyhound e Trailways), sendo que o próprio modelo foi a base para o desenvolvimento do Dinossauro.

    Ela chegou a operar o transporte coletivo urbano em Ribeirão Preto (com ônibus comuns LPO) até 1984, quando os trólebus locais iniciaram suas operações e a empresa decidiu sair do ramo (a CCTC encerraria as suas atividades em 1989). Já a Impala era uma empresa pertencente à própria Cometa, tanto que ela chegou a ter uma frota igual à da empresa-mãe, com cores diferentes (vermelha); ela foi vendida para a mineira Gontijo em 1996, incluindo a frota.

    Em tempo: Ivan Comodaro foi o último superintendente da Cometa quando a empresa era dos Mascioli e ele que falava em nome da empresa para a imprensa.

  4. Tenho saudades da Cometa, viajava na linha São Paulo a Poços. Morei em São Paulo da década de 80 ,gostaria de ver uma reportagem sobre a Santista ” fábrica de tecidos”Belenzinho e Tatuapé

  5. Gostaria de saber se é Fato ou fake, sobre copo de água cheio em cima do painel frontal do veículo, pra fazer teste de habilidade dos motoristas dos carros da cometa.
    Sendo contratado se não transbordasse a água do copo.
    Teste para conduzir o veículo para não dar solavanco para conforto dos passageiros e também pra preservar o veículo.

    1. Fui motorista da viação Cometa , mais quando entrei já não tinha o teste com o copo, mais existiu sim esse teste.

      1. Sinto Saudades deste Ícone transportes Rodoviários onde aprendi ser bom Chofer hoje só lembranças linha fazia Cpn Rib Preto vais meu carinho.todos fizeram parte desta grande História Transportes

  6. Excelente matéria! Viajei muito pela Cometa, seus motoristas eram referências para todos motoristas, pois dirigiam com muita técnica e responsabilidade. Quanto aos veículos, concordo que eram ícones, e o são até hoje, para aqueles que tiveram o privilégio de embarcar em um deles.

  7. Fui motorista da viação Cometa, entrei em 1976 e sai aposentado em 1996, pra mim deixar a empresa fui 3 x pedir a conta, mas eles pediam para continuar trabalhando ,mais sai para comprar um caminhão e me arrependi muito de deixar está empresa, se eu pudesse voltar a trabalhar nesta empresa eu voltava.

  8. Parabéns pela reportagem, é importante relembrar histórias de empresas tão relevantes na vida de muitas pessoas, Cometa e Impala que era um exemplo em transporte de passageiros . obrigado por esta lembrança.

  9. Meu pai foi investigador particular do seu Tito, mandava ele, meu pai verificar qualquer acidente ocorrido e qdo meu pai descobriu que o acidente ocorreu porque o motorista estável fazendo jornada dupla ( proibido pelo Sr Tito) para poder comprar uma casa eu Jacareí e neste acidente perdeu as duas pernas seu Tito deu uma casa para o motorista.
    Enio Cintrra

  10. Não trabalhei na empresa, sou usuária, mas sou tri bem atendida gosto muito de viajar nos ônibus da cometa.

  11. Eu Manoel Morais de Barros trabalhei de 1988 a 1996 , tenho orgulho de ter dirigido os flecha azul do cometa , só alegria , sai porque me aposentei , mas sinto saudades, abraços a família COMETA

  12. Fui motoristas dessa grande empresa, nos anos 90, no setor de campinas, na qual era chefiada pelo Sr Sergio, pessoa maravilhosa, um ótimo profissional, com os expetores Terrine, Suel, João, Claudionho e Bonetti, era a única empresa que pagava o deísmo quarto salario, nós saímos de férias por 30 dias, mas quando voltamos o salario estava na conta, sem contar que nosso encarregado era uma lousa, chegávamos das viagens, parava na bomba de combustível, recolhia nossos pertences, olhávamos para a lousa, onde já estávamos escalado para a próxima viagem, sem contar que os alojamentos era maravilhosos, até hoje sonho com as minhas viagens, sonho que estou na roda de um flecha Azul, pois eu era rodão, não era roda presa, os amigos vão saber o que estou falando, sem contar que a elegância dos motoristas bem uniformizados impecavelmente, Óculos De Sol Ray Ban Aviador, gravata nó rosa, sapato Vulcabrás mocasim, um espelho, sinto muitas saudades da imortal viação cometa.

  13. Parabéns, excelente recordação, mas não se pode esquecer de mencionar também algo tão precioso onde a viação Cometa tinha um grande destaque que era a Estação da Luz, que merece um trabalho jornalístico a parte

  14. Acrescentando – na antiga Revista BANAS, numa edição da qual tinha como “mote” – As Grandes Companhias – pelos anos 1973/74; 1974/75 et 1975/76, apresenta nomes dos Principais Acionistas, dentre eles – João Havelange, com pouco mais de 5 %; bem como, na revista ACRÓPOLE, editada pela Arquitetura, na edição 237, de 1958, há reportagem da garagem da antiga Cometa URBANA, na capital paulista, sita na rua Padre Adelino, o que depois foi para a associada IMPALA Auto Ônibus (no que na “internet” – sobre o bairro Belém, há uma Foto)

  15. Essa grande Emprea fa parte da,minha infância com minha mãe.
    Rio de Janeiro, Campinas m,São Paulo viajava muito saudade eterna.
    Tempo bom que não volta mais,uma saudade gostosa seria maravilhoso,se pudesse retroceder voltar no tempo

  16. Eu trabalhei nos anos 72 a 73,na parada do tamborindeguin,em itatiaia, na rodovia Dutra, eu tinha 14 anos e fiz muitas amizades, mas uma que me marcou foi um motorista, por sinal muito educado e atencioso com todos,ele fazia Campinas a Juiz de fora, ou vice versa,o nome dele é Adilson da Silva, acabei saindo e nunca mais o vi,e sequer notícias dele
    Lembro dele com muito carinho
    E se alguém tiver notícias
    Obrigada

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *