O final da década de 30 foi uma época que São Paulo passava pelo começo de um período de grande crescimento urbano, imobiliário e também de tráfego de veículos. Algumas avenidas paulistanas eram já bastante movimentadas, com carros, ônibus, caminhões e, principalmente, bondes.
E os bondes eram protagonistas de muitos acidentes pela capital paulista, geralmente envolvendo pedestres. A efervescente avenida Rangel Pestana era um ponto catalizador de ocorrências, especialmente no trecho entre a rua Piratininga e o Largo da Concórdia.
A fotografia abaixo dá uma boa ideia de como era caótico o trânsito por ali para a época:

Cruzamento entre Avenida Rangel Pestana e Rua Piratininga
Foi no ano de 1938 que a prefeitura paulistana começou a buscar uma solução prática para diminuir os acidentes neste trecho da avenida e, principalmente, dar segurança aos alunos do Grupo Escolar Romão Puiggari que atravessavam diariamente a via para ir até a instituição.
A solução encontrada foi a construção de uma passagem subterrânea que ligaria os dois lados da Rangel Pestana. Em 24 de setembro de 1938, ela estava pronta para o uso pelos pedestres:

Crédito: Correio Paulistano
Apesar de não ter sido adotada em massa, já que muita gente achava mais prático atravessar a via por cima do que descer e subir escadas, a passagem subterrânea reduziu bastante o número de acidentes na avenida. Inclusive, nos anos seguintes, houveram pedidos de construções de passagens similares, pela população, em outros trechos da cidade como na Praça da Bandeira, outro local que era foco de muitos problemas.

A passagem subterrânea da Avenida Rangel Pestana em 1939
A passagem tinha entrada de um lado na calçada de uma das lojas mais famosas do Brás, a R.Monteiro e do outro lado bem diante da entrada principal do Grupo Escolar Romão Puiggari.
Construída com ladrilhos brancos em suas paredes, a passagem contava até com um zelador que a mantinha em boas condições de uso durante todo o dia. À noite porém, com o tempo, o local começou a servir de banheiro público e o forte cheio de urina ou mesmo de creolina após a limpeza, passou a afugentar os pedestres, que voltavam a optar a cruzar a avenida pelas pistas.
Com o tempo a zeladoria também foi removida da passagem e apareceram inúmeros problemas de assaltos. Cada vez mais insegura, suja e fétida o local foi completamente abandonado pelos usuários, até que no início dos anos 60 ela foi desativada e fechada pela prefeitura.
A PASSAGEM SUBTERRÂNEA ATUALMENTE:
Fomos até o local para procurar indícios da antiga passagem subterrânea e para comparar a região atual com a da fotografia de 1939. Salvo por alguns prédios construídos nos anos seguintes, a região nem mudou muito.
O prédio do Grupo Escolar Romão Puiggari segue lá, funcionando e bastante preservado diga-se de passagem. Do outro lado da avenida, o centenário Palacete Andrioli, embora bastante deteriorado, sobrevive como pode.
A Igreja Bom Jesus do Brás, uma das mais belas de São Paulo, também segue firme e forte, tendo sido seu exterior recentemente restaurado. A seu lado (fora da fotografia acima) o Edifício R.Monteiro também segue bem conservado, apesar de não ter mais em seu térreo a tão famosa loja que o consagrou.
Já a passagem subterrânea ainda existe, hoje cimentada e isolada. Apesar de já se ter passado pouco mais de quatro décadas de seu fechamento ainda é possível observar o local exato das duas entradas, como mostram as fotografias a seguir:

Entrada na calçada do Edifício R. Monteiro
Será que passado todos estes anos a passagem subterrânea da Rangel Pestana segue preservada lá embaixo ou já teria sido tomada por infiltrações de água ? Se ainda está ali seria muito interessante vê-la reaberta ao menos durante o dia pois trata-se de uma passagem antiga e até histórica.
Conversando com uma ex-aluna do Romão Puiggari ela me contou que usava a passagem todos os dias ao ir e voltar da escola e sempre comprava doces de um senhor, chamado Salim, que tinha uma barraquinha na calçada oposta ao Grupo Escolar. Era bastante comum barraquinhas de doces nas portas das escolas, bons tempos.
Em tempo, nos anos 40 houve uma licitação para a construção de uma passagem subterrânea igual a esta no cruzamento da avenida Lins de Vasconcelos com a rua Basílio da Cunha, no Cambuci. Entretanto não encontramos referências de que ela tenha sido construída de fato.
E você, caminhou por essa ou outras passagens subterrâneas de São Paulo ? Deixe um comentário!
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