A Rua Florêncio de Abreu atualmente é uma via que fervilha de pessoas caminhando o dia inteiro. Isso se deve ao fato da rua ter se transformado no principal endereço de ferragens e ferramentas de São Paulo e também por estar colado ao endereço mais agitado da capital paulista: a Rua 25 de Março.
Porém muito antes a rua era um dos endereços mais elegantes de São Paulo, com casarões, palacetes e a medida que o anos iam passando pelo século 20, alguns hotéis.
E um deles vamos falar aqui, trata-se do já extinto Palace Hotel:
Localizado no atual número 418 (antigo 102) da Rua Florêncio de Abreu, o Palace Hotel foi um dos vários que surgiram na cidade naquela década para trazer mais conforto para viajantes. Por isso ficava relativamente próximo das linhas férreas São Paulo Railway, Sorocabana e Cantareira.

Inaugurado em 1920 é obra do célebre arquiteto Ramos de Azevedo, que também projetou o Palacete Barros que fica exatamente em frente a este, do outro lado da rua.
Com a edificação sendo propriedade então de Augusto Rodrigues e o hotel de Guilherme Seabra, foi considerado um dos mais modernos do país em sua época de acordo com a imprensa contemporânea à sua inauguração. Em suas dependências existiam 130 quartos, um grande salão de refeições, salão de concerto e uma luxuosa sala de visitas.
Os quartos eram todos dotados de luz elétrica, água corrente (algo nem sempre presente nos quartos de hotéis da época), aquecedores elétricos e telefone.
A cerimônia de inauguração ocorrida na noite de 17 de julho de 1920 foi bastante concorrida e contou com a presença de paulistanos ilustres, políticos da cidade e grande parte da imprensa.
O hotel logo cairia nas graças não só de hóspedes, como de paulistanos que se utilizavam das dependências para tomar chá, assistir pequenos concertos e a realização de festas e solenidades. A fotografia abaixo mostra um jantar oferecido ao grande escritor brasileiro Monteiro Lobato em 1921.

Com o deslocamento do público cliente das redes hoteleiras para outras regiões do centro paulistano, como os arredores da Praça da República, Avenida Paulista e Ipiranga o hotel foi aos poucos perdendo sua relevância, mas prosseguiu funcionando até a década de 1970.
Após fechar a área foi vendida e atualmente pertence a Magazine Pelicano LTDA e São Felipe Agropecuária Comercial S/A e funciona ali o centro de compras popular conhecido como Shopping 25 de Março.
Para adaptar um hotel a um centro de compras ocorreu um grande reforma – de gosto bastante duvidoso – pois tirou praticamente todo o encanto da fachada projetada por Ramos de Azevedo, deixando-o com o visual “pelado” por estar ausente dos detalhes originais.
Atualmente na cor amarela, o prédio já teve uma berrante cor azul e antes da Lei Cidade Limpa tinha sua fachada com letreiros e luminosos maiores e que escondiam ainda mais o pouco do que resta do que um dia foi um charmoso hotel projetado por um arquiteto cujo nome é um símbolo da capital paulista.
Veja mais fotos do antigo Palace Hotel no momento de sua inauguração:
Bibliografia consultada:
* A Vida Moderna – edição 0388 (julho 1920) pp 20,21 e 25
* A Vida Moderna – edição 0412 (1921) pp 18
* A Cigarra – edição 0386 (julho 1920) pp 16
* Correio Paulistano – edição de 17/06/1920
* Correio Paulistano – edição de 17/07/1920
* Correio Paulistano – edição de 18/07/1920
* Base de dados de IPTU da Cidade de São Paulo, ano base 2019
Respostas de 29
Como é possível que o responsável pela reforma não tenha tido a menor consideração para com a fachada original? É incrível.
Bem interessante , sera que V tem fotos do Hotel Terminus (o primeiro) na rua SenADOR qUEIROZ
Eu conheci o segundo, na Ipiranga, onde adorava comer na doceria. Ele era uma unidade que também havia em Sorocaba e outra em Campinas (desta, o prédio em estilo art déco teve a fachada preservada, cedendo lugar ao Magazine Luiza, não ficando abandonado); depois a doceria foi adquirida por José Legaz de Castro, que manteve a mesma equipe de confeiteiros, depois mudou o nome para Teamimos, que chegou a ter 3 unidades, e, pelo que vi de informações na internet, acabou falindo. Da doceria de São Paulo, primeiramente eram os produtos fornecidos por um tal de Brunnhof; depois de desfeito o contrato com este, os doces “ocidentais” foram da Doceira Doria (sediada na Rua Conselheiro Ramalho e “irmã” da Dolcella da Brigadeiro Luiz Antonio), os “orientais” de um sírio chamado Nadin, os pastéis de Santa Clara da Doçaria Portuguesa de Atibaia e os bombons e chocolates da Fachga.
Você tem alguma informação do Hotel Danúbio, tinha o balneário Danúbio ao lado. Ficava na Av. Brigadeiro Luiz Antônio.
Tem uma matéria sobre esse hotel aqui no site.
https://saopauloantiga.com.br/hotel-danubio
Quanta ignorância, que tristeza, era possível manter a fachada e modificar o uso numa boa
Douglas, você é incrível! Adorei as fotos e a riqueza de detalhes que conta a história!
…
Na av Liberdade, em frente ao fim da rua Condessa de São Joaquim, havia um belo palacete, o qual as FMU conseguiram demolir, sem nem deixar fachada!. E isso porque se trata de uma instituição de ensino heim!
Convivi por anos com o que restara do antigo palacete, pois estudava na Álvares Penteado, um pouco mais abaixo.
Você sabe alguma coisa sobre tal prédio?
….
Grato,
Mário Sérgio Rodrigues B. Oliveira Paschoal.
Olá Mário Sérgio, como vai ?
Esse que você falou eu não conheço, mas vou tentar descobrir.
Concordo com a opinião do editor , Douglas Nascimento, quanto ao “gosto duvidoso”…. Pobre Ramos de Azevedo, deve estar se revirando no seu túmulo com tanto desgosto. Assassinaram uma de suas obras primas. Se fantasmas existissem…..
Eu suspeito que os novos adquirentes, querendo manter o hotel em funcionamento, optaram por substituir as janelas originais de madeira por janelas seladas, quiçá porque os quartos estejam climatizados com ar condicionado, e esquadrias de alumínio seladas, sairiam mais baratas. Baixando o custo da conta eletrica e de materiais de reforma.
Pior ainda, com a modificação estética da fachada, o novo proprietário, ainda que não intencionalmente ( wink, wink ) driblou qualquer tentativa de ação de tombamento do edifício.
No meu ver, tais modificações estéticas foram completamente desnecessárias, não acrescentando nada em termos de funcionalidade, e matando o carácter do edifício.
Eis o porquê…..
O burburinho da Florêncio de Abreu não incomoda, em termos de ruído. E é até salutar, em termos de experiência de estadia ( O mero conceito de Hotel Boutique e completamente alienígena aos nossos investidores caboclos, que se impressionam mais com Hotéis Cadeia Pasteurizados e não se dão conta que a diária mediana de Hotéis em edifícios sui generis e potencialmente maior do que hotéis padrão ).
Ademais, a Florêncio de Abreu não vai ser eternamente um local onde você compra ferramentas, ferragens, ou bugigangas Made In China. Isto eventualmente mudará. Eventualmente o local demandará algo com mais panache. O que a atual estrutura não tem.
Antigamente não existia ar condicionado, portanto, cômodos de escritório ou de dormitórios ( que sao essencialmente quartos de hotel ), eram dimensionados de acordo, com amplas janelas e generoso pé direito. Ar quente, mais leve, sobe. Portanto, com janelões e pé direito alto, a circulação de ar quente e eficiente ao ponto de se prescindir de ar condicionado. E convenhamos, naquela época, as pessoas trabalhavam e transitavam, e habitavam de vestido & paletó, gravata e chapéu. Sem A/C Split, ventiladores, quando muito, nos tetos.
Notem também, as varandas Julieta, no último andar, que muito dão graça aos quartos e a fachada. A vista matinal, ou de crepúsculo daquela época certamente era mais interessante do que agora. Porém matar as varandas Julietas e como operação plástica mal sucedida feita por açougueiro Certamente seriam os quartos com diárias mais altas, ( suites de luxo ), então na época. Mataram isto. Pra que, nao sei.
Noooossa, comparando a foto antiga com a atual, constatamos que nada foi mantido…. Um prédio ainda bonito, mas não mais o mesmo prédio. Fachada completamente modificada. É uma pena!
No final dos anos 70 estive numa festa de bodas de ouro num famoso hotel em frente à Igreja de Sta Ephigênia, porque os descendentes quiseram homenagear os nubentes, já que o casamento deles, há 50 anos atrás, aconteceu nestes mesmos dois lugares citados: igreja e hotel…Teria como fazer reportagem? Grata
Olá Elizete, neste caso tanto o hotel como a igreja seguem lá firme e forte. Em breve vou publicar o hotel aqui.
Se for o Alvear, na rua Casper Libero, esclareço que fiquei muitas vezes hospedado nele com meus pais e meus irmãos: de uns tempos pra cá mudou o nome para Mariano Alvear Palace Hotel.
Adoro voltar no tempo com reportagens como esta! Parabéns e obrigada!
Excelente reportagem!
Muito interessante
A minha esposa tem um consultorio há 30 anos pertinho desse predio.Eu lembro ainda quando tinha a loja Pelicano ali.Eu pensei que o dono do predio fosse de um senhor chines, que tem alguns shoppings na região..
Adorei !!!
Uma pena como o ser humano parece que tem prazer em “destruir” suas memórias…
Eu diria que o hotel não só foi descaracterizado de seu formato original como deixou de existir. Que horror!!
Que horrível desfiguração da fachada! Perdeu todo seu charme em troca de traçados toscos e brutos!
Não manteve a fachada porque caiu nas mãos da máfia chinesa. Lar Kim chão
Parabéns pelo ótimo artigo!
Colocar o original e o atual edifício lado a lado, sensibiliza as pessoas sobre a pobreza de espirito e mente pequena de gente que transforma algo histórico e de imponente beleza em um predinho vulgar e sem graça. Se tivesse posto abaixo o original e construído outro, qualquer que fosse o estilo, ou falta dele, seria mais compreensível do que essa simples transformação estúpida…
Fantástico seu trabalho , parabéns
Excelente trabalho de pesquisa, trazendo toda a essência do Hotel, que mereceria um melhor destino.
Douglas é uma pena, não quizeram nem preservar a fachada, trocaram o bonito pelo bastante duvidoso!
Fiquei feliz em imagem do Palace, me hospedei 2 vezes e também num que ficava em frente.
Gostaria de saber se há em algum lugar as plantas das casas que Ramos de Azevedo projetou em São Paulo, pois queria localizar a da casa da minha tataravó que era na Av. São João.
Algumas plantas, não todas, estão disponíveis para consulta no Arquivo Histórico Municipal Washington Luís.
Bom dia, Douglas. Esse arquivo continua no local conhecido como Chácara Lane, na Rua da Consolação?