Na década de 1920 o Estado de São Paulo daria passos importantes rumo a modernidade. Na capital paulista, a Semana de Arte Moderna seria um marco definitivo entre o passado basicamente cafeicultor e o futuro industrial e progressista.
Novas indústrias surgiam em todos os cantos da cidade. E foi nesse clima de desenvolvimento que industriais corajosos buscavam novos locais para ampliar seus negócios. E foi assim , pioneiros, que os irmãos Carbonell em 1923 inaugurariam na vizinha cidade de Guarulhos uma das mais importantes indústrias têxteis da época: a Fábrica de Tecidos Carbonell.
Se São Paulo ainda era pequena nos idos de 1923, imagine então a vizinha Guarulhos. Hoje, as duas cidades cresceram muito e suas divisas se fundiram de uma maneira tão peculiar que muitas vezes não sabemos se ainda estamos em São Paulo ou se já estamos em Guarulhos. Entretanto naquela época chegar até esta cidade era muito mais complicado, com ligações a capital basicamente pelo rio Tietê, trem da Cantareira ou pela Estrada da Conceição dos Guarulhos (atual Avenida Guarulhos e Rua Gabriela Mistral).
Isso tudo mostra a coragem e a determinação dos irmãos Hilário e Henrique Carbonell, homens que mesmo ciente das dificuldades que era transportar a produção para a capital apostou em sua cidade e desenvolveu a industrialização local.
Entretanto, 86 anos depois a cidade de Guarulhos não soube agradecer e respeitar estes grandes homens e o que sua indústria representou, e com a anuência da prefeitura da cidade o último resquício da família Carbonell e sua indústria guarulhense desapareceu. O último casarão dos Carbonell em poucos dias deixou de existir. O feito deplorável aconteceu neste momento em que a cidade de Guarulhos começa a preparar os festejos de seus 450 anos que ocorrerá em 2010.
Nossa equipe esteve no local desde o início da demolição e acompanhou tijolo por tijolo a morte dolorosa de um símbolo dos guarulhenses.
A Fábrica de Tecidos Carbonell no baixo terreno da propriedade já havia sido varrida do mapa há algumas décadas. A fábrica fechou suas portas na década de 90 e no seu lugar torres de apartamentos de luxo já preparam-se para serem erguidas por uma construtora que implementou um luxuoso estande de vendas no terreno.
Eram dois casarões no local, idênticos. Um já havia sido desconfigurado e o outro casarão resistia bravamente onde funcionava até pouco tempo o Colégio Eleonora Carbonell, cujo nome homenageia a esposa de Henrique Carbonell. O colégio, que não mais pertence à família aos poucos está se transferindo para outras unidades uma na Vila Hermínia e outra na Vila Augusta, que será inaugurada em 2012.
Não poderíamos deixar de citar este triste acontecimento que foi a demolição deste casarão que ainda restava, pois uma parte da história de Guarulhos acaba de ser apagada definitivamente, privando os guarulhenses de sua cidadania. Em seu lugar, infelizmente, mais um prédio de apartamentos será erguido. No último dia que fomos lá a única coisa que restou do casarão foi a placa com a numeração do local jogada no chão , algumas árvores (várias foram derrubadas) e uma placa indicando que ali havia um parque para os alunos do colégio.
Nenhum jornal na cidade de Guarulhos noticiou o triste fim do casarão Carbonell, fato que choca tanto pelo silêncio como pelo provavelmente desconhecimento do fato pela imprensa local, a ausência de aulas sobre os bairros nas escolas formam legiões de pessoas que ignoram a história do local onde vivem, facilitando que incorporadoras apaguem suas histórias sem muita dificuldade.
Outros bens de guarulhos também correm risco de sumir:
Guarulhos possui outros bens históricos ou importantes que correm sério risco de desaparecer, seja pela especulação imobiliária, descaso das autoridades ou simplesmente abandono. Veja abaixo outros quatro locais da cidade que encontram-se abandonados:
– Stadium Dr. Lauro de S. Lima: Localizado em frente do recém restaurado Teatro Padre Bento, o estádio quase centenário é o exemplo do abandono e do descaso em um bairro onde faltam praças esportivas. Não distante dali a prefeitura investiu alguns milhões no campo do time de futebol local, enquanto este campo que, segundo dizem, é tombado pelo patrimônio histórico está em completo estado de penúria. Neste estádio, nota-se especialmente o lindo pórtico de ferro na entrada e a incrível arquibancada de madeira em estilo inglês, raríssima de se encontrar no Brasil. Está apodrecendo cada dia mais.
– Mansão de José Maurício de Oliveira: Residência do ex-prefeito da cidade José Maurício de Oliveira (1919-1930 e 1940-1945) o belíssimo casarão encontra-se em estado de completo abandono e não deverá demorar muito a ruir. Localizada na região central de Guarulhos diante do antigo prédio da prefeitura, está em uma esquina de alto valor imobiliário. Futuro incerto.
– Casarão Eclético: Este casarão da região central de Guarulhos também está há muito tempo abandonado e à venda. Pouca informação existe sobre quem morou ali. Pelo estilo de sua construção e pelo fato de ser bem mais baixa que o nível da rua onde está localizada percebe-se que se trata de uma das mais antigas construções da cidade de Guarulhos que ainda está de pé. No local, inúmeras faixas de imobiliárias vendendo a área mostra o risco deste casarão desaparecer como o de Henrique Carbonell.
– Estação de Vila Augusta: Uma das últimas estações do extinto Tramway da Cantareira que ainda resiste ao tempo, a estação de Vila Augusta está abandonada. O local, em uma avenida de grande movimento e em franco crescimento urbano, poderia ser aproveitado como um museu do trem da Cantareira. Segundo vizinhos desde a década de 70 o local está invadido.
Bibliografia consultada:
VÁRIOS. Guarulhos Espaço de Muitos Povos, 1a ed. Guarulhos: Editora Noovha America, 2007 RIBEIRO, Silvio. Destino… Guarulhos, A História do Trem da Cantareira, 1a ed. Diadema: Editora Germape, 2005 VÁRIOS. Guarulhos Tem História, 1a ed. Guarulhos: Ananda Gráfica, 2008 |