Toda cidade importante no mundo tem suas áreas destinadas para diversões ao público adulto. Las Vegas, Amsterdã, Tóquio, Buenos Aires e muitas outras metrópoles do mundo, sabem que este tipo de entretenimento, desde que fiscalizado e controlado como qualquer outro negócio, atrai turistas e gera dividendos para a cidade.
Mas São Paulo, onde divertir-se parece que a cada dia que passa é mais difícil, vai na contramão do resto do mundo. E o capítulo mais recente desta história culminou com a demolição do imóvel de uma das boates mais conhecidas de nossa cidade: A Kilt Shows.
O entretenimento adulto na capital paulista vem sofrendo muita pressão nos últimos anos, desde a polêmica iniciada pelo Prefeito Gilberto Kassab contra o hotel da boate Bahamas, de Oscar Maroni, em Moema até a recente fúria da especulação imobiliária na Rua Augusta, que vem fechando e demolindo uma série de boates para dar lugar a novos edifícios de alto padrão. A região do Baixo Augusta, como é conhecida, parece fadada a uma transformação que não necessariamente será benéfica para ela e seus frequentadores.
Um dos endereços mais famosos da noite paulistana, a boate Kilt foi inaugurada em 1971 pela famosa e bem sucedida empresária Tânia Maciel.
A história da boate começou quando a empresária quis abrir um bar para o happy hour de empresários e executivos na região central de São Paulo, em uma época que esta região da cidade ainda tinha muitos hotéis de alto padrão, como Cad`Oro, Hilton e Othon, funcionando a todo vapor.
A casa desde o princípio foi um exemplo de sucesso na noite paulistana. A localização privilegiada à época, fazia com que a boate estivesse sempre cheia e bem frequentada não só por empresários, mas também por celebridades brasileiras e internacionais, pilotos de Fórmula 1 e até políticos.

Publicidade da Kilt veiculada em publicação erótica de 1982
A arquitetura da Kilt não surgiu por acaso e não foi desde o início como era conhecida até seus últimos dias. Tânia Maciel, proprietária da casa, tornou-se a maior vendedora de uísque da marca Black & White no Brasil.
Isso rendeu um convite da empresa para conhecer a sede da destilaria na Escócia. Visitando o país, a empresária encantou-se com o castelo da Rainha Mary Stuart e foi assim que obteve inspiração para deixar o imóvel da boate com o ar de castelo europeu, e que hoje não existe mais.

O Castelo de Mary Stuart, na Escócia.
E a inspiração não ficou somente no lado externo da boate. O interior da casa foi também inspirado em algo daquele país, mais precisamente na tradicional vestimenta escocesa que não por acaso é também o nome da boate, o Kilt. O traje é um saiote masculino comum naquele país, e também serve como uma fácil identificação do folclore da Escócia mundo afora.
Apostando em uma arquitetura única na cidade de São Paulo e aliando bom gosto a um bem executado projeto comercial, a casa logo se tornou a maior referência da cidade para entretenimento masculino, em uma época que já existia na cidade um grande concorrente de peso, a já extinta boate La Licorne, não muito longe dali na rua Major Sertório, em Vila Buarque.

O interior da boate que foi demolida nos dias 07 e 08 de setembro de 2012.
Porém tudo isso virou passado agora, ou melhor, virou pó. No primeiro final de semana de setembro de 2012 a boate que já havia sido desapropriada e desativada alguns dias antes, foi demolida completamente em prol de uma rotatória que irá integrar a Praça Roosevelt com o Teatro Cultura Artística.
A prefeitura garante que a demolição da Kilt é um importante passo para a revitalização da região, mas será que era realmente necessário demolir a boate ? Ou ela no chão atende a outros interesses ?
A destruição da boate Kilt Shows parece mais um gesto de elitização da região do que de revitalização. Um processo de recuperação de uma área urbana não se faz com escavadeiras e especulação imobiliária, mas sim com projetos de integração entre moradores, consumidores e frequentadores do entorno.
A Rua Nestor Pestana é um dos endereços mais ecléticos de São Paulo, mais até que a própria Rua Augusta. Em sua curta extensão ela possui de tudo um pouco: boates, teatros, igreja, supermercado, residências e até uma filial da Associação Cristã de Moços.
Vários comerciantes do entorno da Praça Roosevelt estão reclamando das mudanças que estão chegando com a nova praça. Os preços dos aluguéis estão dobrando em alguns casos e há comerciantes tradicionais da Rua Martinho Prado e da Nestor Pestana que estão deixando a região.
Aqueles que sempre acreditaram neste pedaço da cidade, mesmo no período de decadência da Praça Roosevelt estão sendo obrigados a deixar suas lojas e irem para outros locais, em virtude da especulação.
A demolição da Kilt não foi apenas a retirada de um prédio que “atrapalhava” a melhoria da região. Foi a destruição de um lugar que, embora nem todos os paulistanos gostassem, era um símbolo de São Paulo. Símbolo este que a partir de hoje fica apenas nas fotografias e nas lembranças de clientes, fãs e funcionários.
A casa reabriu em um novo imóvel na mesma rua. O charme, porém, não é mais o mesmo.
Veja mais fotos da Kilt Shows (clique para ampliar):
Crédito da foto 02: Diego Vargas / Demais: Douglas Nascimento
Curiosidade – Fotografia de 1970:
Extraída de um filme documental da Emplasa a captura abaixo mostra a construção que posteriormente abrigaria a Kilt, antes de ser transformada na imitação de castelo que tornou-se popularmente conhecida.

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