Na Rua Benjamin Constant, 171, região da Sé, um edifício já quase centenário abriga uma belo relevo esculpido na fachada e uma série de outras curiosidades, tanto na edificação quanto na história do terreno. E aqui vamos conta-las uma a uma para você.

O PRÉDIO:
Encomendado pelo cafeicultor paulista João Batista Mello de Peixoto aos engenheiros Alexandre Ribeiro Marcondes Machado*¹ e Otávio Ferraz Sampaio, o Chavantes foi construído na segunda metade da década de 1920, precisamente entre 1926 e 1930, sendo originalmente destinado para fins residenciais.
O edifício possui 10 andares e é rico em detalhes, tanto em sua fachada quanto em seu interior, onde notadamente o hall de entrada e os elevadores se destacam bastante.
Apenas na década de 1940 é que o prédio sofre uma transição e passa a ter suas unidades colocadas à venda com destinação comercial, sendo utilizado para essa finalidade até os dias atuais.
O anúncio abaixo, publicado nos jornais paulistanos, mostra as unidades já à venda.

ANTES, A TRAGÉDIA:

Francisco de Assis Peixoto Gomide, ou simplesmente Peixoto Gomide como era mais conhecido foi um dos mais importantes e influentes políticos paulistas da virada do século XIX para o XX.
Senador do Estado de São Paulo por dois mandatos e presidente interino do Estado entre os anos de 1897 e 1898, Peixoto Gomide seria o grande protagonista de uma tragédia que chacoalhou a capital paulista e seu meio político e intelectual.
Corria o início do ano de 1906 e sua filha, Sophia, se preparava para casar-se com o poeta, romancista e advogado Batista Cepelos. A convivência dele com Peixoto Gomide se originou teoricamente quando o poeta ainda era estudante de direito, cujos estudos foram bancados pelo político.
Essa mesma convivência foi que fez com que os jovens conhecessem e se apaixonassem, decidindo assim pelo casamento. O pai desde o início era contra mas acabou, mesmo contrariado, aceitando.
Entretanto faltando poucas semanas para o enlace, em uma manhã de janeiro de 1906, Peixoto Gomide chamou sua filha para conversar e acabou por disparar contra ela, matando-a imediatamente. Em seguida retirou-se para o escritório da casa onde suicidou-se com um tiro na cabeça.
As razões do crime seguido de assassinato foi o fato de que havia um forte rumor que seu futuro genro era também seu filho.
O noivo, Batista Cepelos, morreria anos mais tarde em 1915 em circunstâncias estranhíssimas, e nunca se descobriu se foi assassinado ou se cometeu suicídio.
A razão de contarmos isso ? É que a casa do senador Peixoto Gomide era exatamente no local onde está o Palacete Chavantes. A propriedade foi parar nas mãos de João Batista Mello de Peixoto, fazendeiro paulista que casou-se com Guineza Gomide, a outra filha do falecido senador.
PORQUE O NOME CHAVANTES ?
Atualmente os prédios não seguem uma motivação histórica ou familiar ao serem batizados pelos seus construtores, aliás hoje em dia o que se vê é um grande de número de prédios com nomes cafonas, sem sentido ou com anglicismos exagerados.
Não é o caso do Chavantes, cujo nome é uma homenagem à cidade homônima onde João Batista Mello de Peixoto foi não só um de seus fundadores como também seu primeiro prefeito (1923 a 1925).
Dono de fazendas de café na região batizou o prédio em homenagem à cidade que ajudou a criar.
DA FAZENDA PARA A FACHADA:
Talvez a porção mais bela de todo o edifício não seja sua primorosa arquitetura, mas essa magnífica e sensível alegoria em alto relevo da colheita de café que está instalada logo acima da pórtico de entrada.
Não há confirmações documentais, mas diz-se que a cena foi esculpida pelo artista – infelizmente anônimo – após o mesmo visitar a propriedade rural da família do proprietário em Chavantes. Se é verdade dificilmente saberemos, mas a imagem é primorosa.
OS ATLANTES E A CRISE DE 1929:
Por fim há outros detalhes que chamam a atenção na fachada. Um deles são os ramos de café, dispostos juntos aos arcos do térreo em um total de dois pares, é uma lembrança ao café grande fonte da riqueza de seu construtor.
Mas essa riqueza em um certo tempo encontrou a crise. Em 1929 a quebra da Bolsa de Nova Iorque atingiu em cheio os cafeicultores brasileiros e com João Batista Mello de Peixoto não foi diferente. De acordo com José de Souza Martins, da Faculdade de Filosofia da USP, a construção do prédio foi atingida pela crise quando a obra estava já no quarto andar, sendo que a partir do andar as obras foram simplificadas seguindo apenas uma ala.
Talvez isso dê ainda mais força à simbologia presente nas míticas figures dos dois atlantes*2, símbolos de força, que ao mesmo tempo que parecem sustentar toda a edificação, parece simbolizar o café sustentando a economia do Brasil.
NOTAS:
*1 – Alexandre Ribeiro Marcondes Machado, um dos engenheiros que projetou o Chavantes, era muito conhecido pelo seu pseudônimo de Juó Bananère. Foi também famoso por ser poeta e escritor.
*2- O termo atlante, em arquitetura, refere-se a um tipo de coluna antropomorfa onde, no lugar do fuste, se apresenta a forma esculpida de um homem.
Bibliografia consultada:
- O Estado de S.Paulo – Edição de 21/01/1906 pp 6
- O Estado de S.Paulo – Edição de 28/04/1946 pp 25
- O Estado de S.Paulo – Edição de 27/05/2006
- Chavantes SP por Lilia Alonso – Link visitado em 25/03/2020
- São Paulo e a origem dos Arranha-céus – Borges, Eduardo Fares pp 125 e 126
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