A grande exposição dos 50 anos da primeira imigração oficial em São Paulo

Estávamos no ano de 1937 e nada mais justo do que relembrar e comemorar os 50 anos da primeira imigração oficial no Estado de São Paulo, que se deu em 1887. Para isso, foi realizada uma grande exposição entre maio e setembro daquele ano no Parque D. Pedro. Porém, essa festividade ficou esquecida no tempo. Neste resgate, daremos ênfase à participação italiana, uma vez que é dela que conseguimos interessantíssimo material de época.

clique na imagem para ampliar

A exposição foi montada no pátio em frente ao Palácio das Indústrias, onde, no centro do grande espaço, já estava instalado desde 1922 o Monumento Amizade Sírio Libanesa. A entrada para o evento se dava pela Rua do Gasômetro. Nesta época, este espaço –  conhecido então como Parque do Carmo – ficava entre a Rua do Gasômetro e a Avenida Rangel Pestana, fazendo fronteira com o Parque D. Pedro, que tinha, bem perto de seus bem cuidados jardins, este grande espaço para exposições onde ocorriam eventos na área externa, assim como na área interna do Palácio das Indústrias.

Os visitantes, ao entrarem no espaço da exposição, já se deparavam com o pavilhão do Governo do Estado de São Paulo que, construído pela Secretaria da Agricultura, trazia muitas informações sobre suas atividades.

Vista geral da exposição (clique para ver a imagem limpa)

Logo à esquerda já era possível ver o suntuoso pavilhão da prefeitura municipal, com sua torre de 26 metros de altura. Neste pavilhão, a prefeitura mostrava todas as suas ações e realizações pela cidade, uma mostra fotográfica apresentando aspectos da cidade no passado e naquele momento, mostrando tais lugares pelos mesmos ângulos das fotos antigas, além de mostrar muitos trabalhos realizados no setor de parques e jardins, notadamente o “Serviço de Extincção de Formigueiros” (pelo que foi relatado, era uma praga que infestava os jardins públicos e privados da cidade). Além dos grandes pavilhões, mais de 480 pequenos expositores tiveram a oportunidade de mostrar seus produtos aos visitantes.

Na foto o pavilhão da Prefeitura de São Paulo

A colônia japonesa, com o apoio de seu consulado, também estava presente mostrando os produtos que a coletividade já produzia em São Paulo. Para mostrar seus vinhos e licores, os portugueses se faziam presentes com a “Adega Portuguesa”, assim como os italianos com a “Cantina Italiana”.

O grande salão de festas do encontro era o pavilhão bávaro, organizado pela Cia. Antarctica Paulista, onde, inclusive, havia um grande espaço para danças e todas as noites tocava uma orquestra composta por 12 músicos.

Tudo isso envolto, durante a noite, por um grande efeito de iluminação, além do destaque da grande fonte luminosa que possuía 18 diferentes projeções de luzes.

Detalhe do pavilhão da Itália (clique para ampliar)

Mas o conjunto não se limitava às exposições já que existiam diversas atrações em um parque de diversões montado ao lado, com mais de trinta aparelhos com destaque para o “Looping the loop”, “Water Shoot”, “Bicho da Seda”, “Chicote maluco”, o autódromo, as moto-lanchas, o carrossel, o “Palácio das gargalhadas” e até uma atração chamada de “Mulher cremada”… Tudo isso, além de outras atrações. A organização incluía, inclusive, um serviço de assistência médico-policial para qualquer eventualidade que viesse a ocorrer ou até para fazer pequenos curativos, como bem descreve uma matéria da época.

Pela representatividade dos italianos, além da cantina, chamavam também a atenção o stand da Cinzano, o pavilhão das indústrias Matarazzo (O Conde havia falecido em 10 de fevereiro) e o pavilhão do governo da Itália, que tem uma história bem interessante.

O pavilhão Matarazzo, com destaque para o busto do Conde Francisco Matarazzo na entrada

Um dado importante que explica a razão do destaque e importância dada pelos italianos na exposição é que, da primeira leva de imigrantes que chegou em 1887, 99% eram de italianos e isso, sem dúvida, era muito representativo. O envolvimento da colônia italiana foi tamanho que foram convidados e compareceram os representantes de todas as câmaras de comércio Brasil-Itália existentes no Brasil, além dos representantes das câmaras de comércio italianas da Argentina, Paraguai e Uruguai.

Em 1936, a Itália ainda estava envolvida com a guerra da invasão da Etiópia, mas, mesmo neste momento de concentração de esforços, não deixou de atender ao convite para a grande exposição que aconteceria em São Paulo no ano seguinte. O ministro dos negócios estrangeiros da Itália era o Conde Galeazzo Ciano (genro de Benito Mussolini), cujas lembranças do Brasil eram especiais; afinal, o Brasil havia sido o destino de sua primeira missão diplomática e, além disso, sabia do potencial comercial que o Brasil representava e poderia vir a representar ainda mais. Em janeiro de 1937, ele, Ciano, autoriza a participação oficial do governo italiano através de um pavilhão que seria especialmente enviado ao Brasil.

O pavilhão da Itália, de autoria do arquiteto Ettore Rossi, foi trazido ao Brasil e montado por uma equipe de profissionais italianos chefiados pelo Dr. Guido Renzoni e pelo engenheiro construtor italiano radicado no Brasil Mário Silvio Polacco. Chamava a atenção, além das linhas modernas, as quatro colunas representando o “fascio littorio” , símbolo do regime em vigor na Itália naquele momento e a estátua de Augusto Cesar que depois seria doada à cidade de São Paulo.

A entrada suntuosa do pavilhão da Itália (clique para ampliar)

Os ambientes mostravam toda a energia e poder da Itália na época, através de painéis fotográficos, gráficos e desenhos, em que os visitantes podiam ter conhecimento dos aspectos políticos, artísticos, turísticos, técnicos, agrícolas e industriais da Itália. Um setor era todo dedicado à pequena indústria, que sempre foi destaque na economia italiana. Grandes indústrias estavam representadas pelas automobilísticas Ansaldo e FIAT.

Finalmente, no dia 9 de maio de 1937 era aberta a exposição e o pavilhão italiano com a presença do ministro Conde Guido Romanelli que, como ministro plenipotenciário, teve todas as condições de executar o projeto da participação italiana na exposição. Naquela mesma noite foi servido um jantar de gala nos salões do Hotel Esplanada.

Sem dúvida, foi um grande e festejado acontecimento em uma São Paulo em pleno desenvolvimento.

Um dos anúncios veiculados em jornais paulistanos da época

Veja mais fotos da exposição (clique nas miniaturas para ampliar):

Adega Portuguesa
Pavilhão Matarazzo
Cantina Italiana
Pavilhão Matarazzo
Pavilhão Matarazzo

NOTAS DO TEXTO:

*1 – Arquiteto Ettore Rossi – Foi o primeiro membro da “escola arqueológica italiana” em Atenas a partir de 1915. Aderindo à corrente do racionalismo, em 1936 foi um dos cinco arquitetos a quem foi confiada a elaboração do plano director da E.U.R. Esposizione Universale Roma (ou E42 Esposizione Universale 1942).

*2 – Engenheiro Mario Silvio (ou Sylvio) Polacco era italiano de Camegliano (Montalcino, Siena) e já trabalhava como diretor técnico em obras em Salto de Itu e Osasco antes da primeira Grande Guerra. Durante a guerra voltou para a Itália retornando ao Brasil em 1921. Foi o construtor – entre outras obras – da sede do Banco Francês e Italiano. Morreu em São Paulo em 28 de agosto de 1961.

*3 – Na Roma Antiga, era a arma carregada pelo lictor, um oficial imperial, consistindo em um feixe de varas de madeira, amarradas por tiras de couro vermelho em torno de um machado. O feixe era usado como um instrumento de justiça: as varas eram usadas para punições menores, os machados para a pena de morte. Como simbologia da execução da justiça, uma vara pode ser fraca, mas várias varas unidas se tornam suficientemente fortes para a fazer valer a decisão judicial. Daí a origem da denominação “Vara” para a área administrativa da justiça.

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA:

* La participazione italiana all’esposizione di San Paolo del Brasile 1937-XV, Tipografia  dela Camera dei fasci e delle corporazione. Roma, 1937
* Correio Paulistano – Edição de 01/03/1937 – pp 3
* Correio Paulistano – Edição de 14/03/1937 – pp 5
* Correio Paulistano – Edição de 23/05/1937 – pp 5, 14
* Correio de S. Paulo – Edição de 28/04/1937 – pp 1
* O Estado de S.Paulo – Edição de 18/04/1937 – pp 12
* O Estado de S.Paulo – Edição de 07/05/1937 – pp 8
* O Estado de S.Paulo – Edição de 16/05/1937 – pp 15
* O Estado de S. Paulo – Suplemento em rotogravura

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Respostas de 12

  1. Olá, José Vignoli. Acho que houve uma pequena falha gráfica no texto: que me lembre o nome é Montalcino (com C e não com S). No mais, tudo ótimo.

  2. Parabéns por esse artigo incrível Conheço essa passagem da história, da exposição…e com essa riqueza de detalhes e imagens, só veio a acrescentar mais conhecimento sobre uma das temáticas que me é muito cara, a da imigração nos idos 1870 até o início do século XX. E vendo a marcação de uma imagem como Parque de Diversões, penso que deva ser o Parque Xangai, que faz parte do imaginário de milhares de mooquenses acima dos 65 anos de idade.

    1. Obrigado. Em todo o material pesquisado não se faz qualquer referencia ao Parque Shangai. Muitas das atrações eram novas e até importadas. O Parque Shangai ficava do outro lado do rio o que também me leva a crer que o parque da exposição era exclusivo.
      Vale revisitar o https://saopauloantiga.com.br/parque-shangai/

  3. Gostei. Matéria muito bem preparada e sobre um tema pouco conhecido. Eu mesmo, não tinha referências dessa Exposição. Como militar reformado, fiquei contente em ver no folheto de divulgação, a citação à Banda da Força Pública, que era muitíssimo requisitada para animar bailes e festividades públicas.
    Algumas dúvidas me ocorreram e ficaria feliz se o autor ou algum leitor, pudesse me esclarecer:
    1 – Será que ainda existe e onde estará a Estátua de Augusto Cesar?
    2 – Por quê aparece o ano de 1499, no cartaz usado no Pavilhão da Itália? Terá sido alguma referência a participação na Expedição de Cabral?
    3 – O Parque de Diversões que aparece na foto é a origem do Parque Shangai, que durante muitos anos funcionou na Baixada do Glicério?

    1. Sim. Acabei de ver a outra excelente matéria. Incrível que a estátua esteja preservada há tanto tempo, diferentemente de tantas outras. Lembro-me de uma matéria feita por você, Douglas, a respeito da fonte da praça Julio Mesquita.
      Não é comum eu ir para os lados do Largo do Arouche, mas quando for, não deixarei de visitar o Augusto Cesar

    2. Obrigado.
      Suas questões:
      1 – Conforme o Douglas apontou. https://saopauloantiga.com.br/augusto-de-prima-porta/
      2 – Américo Vespúcio – “…Em meados de 1499 passou ao largo da costa norte da América do Sul, acima do rio Orinoco, como integrante da expedição espanhola de Alonso de Ojeda, a caminho das Índias Ocidentais…”
      3 – Não acredito que seja. Veja meu comentário para a leitora Elizabeth Florido.

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