Um encontro surreal entre os imperadores Pedro I e Pedro II é o ponto de partida de Pedro e o Imperador, HQ que une o roteiro do brasileiro Batista e ilustrações da portuguesa Joana Afonso. A obra integra as comemorações do Bicentenário da Independência, faz parte do Programa Brasil em Quadrinhos, criado em 2019 pelo Ministério das Relações Exteriores – Itamaraty, com apoio e produção da Bienal de Quadrinhos de Curitiba, e é fruto de uma coedição entre as editoras Lote 42, do Brasil, e Polvo, de Portugal.
Pedro e o Imperador foi lançado em 19 de outubro na Feira do Livro de Frankfurt (Alemanha) e no domingo 23 na AmadoraBd, maior festival de quadrinhos de Portugal.
Os traços envolventes de Joana e o argumento que contorciona a história oficial com ironia e surrealismo são marcas presentes em Pedro e o Imperador. Ambientada entre 1871 e 1891, a HQ reproduz um encontro fictício e íntimo entre os Pedros, I e II, para discutir os caminhos de um império em frangalhos.
“Me encantei pela história do órfãozinho chamado Pedro II. Ele não pôde escolher nada. Para ele, era natural ser rei. E termina sua vida não achando a monarquia grande coisa. A obra é sobre ser ‘brasileiro’ nos novos tempos que sopravam”, diz Batista, cartunista, músico e produtor editorial mineiro.
Em determinado momento da história, Pedro I se vê num momento de incerteza, devido à pressão do cargo e das mudanças sociais pelas quais passava o império. É um episódio histórico, em que Batista se aprofundou para discutir também a crise da masculinidade no século 21, algo exemplificado, de uma forma ou de outra, até de forma política por estes tempos.
“Há tempos tenho interesse especial pela vida masculina, principalmente quando ficam velhos. Sobre os problemas do homem em ser homem numa sociedade machista. A experiência feminina se descobre rápido, e diz logo a que veio. O homem segue à mercê da história, e às vezes fica num troninho imaginário”, conta o artista, também coeditor da revista de quadrinhos “A Zica” desde 2014.
A HQ Pedro e o Imperador está sendo lançada em meio às comemorações do Bicentenário da Independência do Brasil, e também a uma pandemia. Isso justifica a obra neste tempo histórico, e também leva consigo marcas dos nossos dias. “Tudo foi escrito sob uma égide traumática, sob a sombra da morte. Talvez tenha uns traços exagerados de melancolia, mas na verdade falamos do abandono de Dom Pedro II. E Brasil é um segundo nome para abandono. É parte de nós”, diz Batista. “Esse processo foi um resgate afetivo com a história do país.”
Joana Afonso, premiada quadrinista portuguesa e doutora em Desenho pela Faculdade de Belas-Artes da Universidade de Lisboa, diz que foi uma surpresa boa perceber que a narrativa ia para além dos dados factuais. “Fiquei aberta a essa novidade e à oportunidade de participar de um projeto além fronteiras. Eu e Batista fomos debatendo as melhores formas de resolver a narrativa visual, e houve desafios, como as situações que não estão documentadas, que mesmo assim reproduzimos”, explica. “Só posso estar empolgada com esta história ver a luz do dia e ter finalmente um exemplar para folhear.” Pedro e o Imperador será impressa e lançada no Brasil e Portugal.