Você conhece o Grão Burgo da Lapa ?

Nomes de ruas e bairros em São Paulo são uma verdadeira bagunça. Vereadores com conhecimento zero da história da cidade fazem o que querem com a nomenclatura municipal, mas o desuso e o desejo popular mudam os nomes dos locais também. Você sabia que o bairro da Lapa era para ser chamado até hoje de Grão Burgo da Lapa ?

A seguir segue um breve histórico do bairro e de onde surgiu esse nome que hoje soa até estranho:

AS ORIGENS DA LAPA

O bairro da Lapa é tão antigo que remonta aos primórdios do povoamento da então São Paulo de Piratininga. A primeira notícia sobre a região é de 1581, quando os jesuítas receberam uma sesmaria junto ao rio Emboaçava, depois rebatizado de Pinheiros.

Desde então, a Lapa nunca mais deixou de aparecer nos documentos históricos de São Paulo, nem mesmo quando os Jesuítas a abandonaram, em 1743. Dados apontam que em 1765 a região toda continha 5 casas e cerca de 31 habitantes.

Rua Afonso Sardinha em 1910, nada se parece com o que é hoje (clique para ampliar)

O desenvolvimento da Lapa de uma área rural para uma região urbanizada e industrializada começou lentamente no século 19. Foi nesta época que por ali começou-se a ter uma pequena população e alguma atividade produtiva, especialmente nas olarias que foram instaladas às margens do rio Tietê. A qualidade do barro daquela região foi peça fundamental na prosperidade de tais olarias.

O grande progresso do bairro deu-se no final do mesmo século 19, com a chegada linha férrea Santos-Jundiaí, em 1867, que passava pelas terras da Lapa. Pouco tempo depois chegariam por ali as oficinas da ferrovia São Paulo Railway (SPR), que proporcionaram o verdadeiro grande desenvolvimento do bairro.

Inicialmente, em 1880, houve o loteamento da Vila Romana em chácaras. Alguns anos mais tarde, em 1891, chegaria o loteamento da área conhecida como Lapa e Lapa de Baixo, mas que naquela época foi batizada de Grão Burgo da Lapa (ou Gram Burgo da Lapa em grafia da época).

Planta do Grão Burgo da Lapa, de 1891 (clique para ampliar)

A rápida adoção do bairro pelas fábricas, que optaram por ficar próximas aos pátios da SPR e da linha férrea, trouxe mão de obra operária em grande quantidade, e o desenvolvimento urbano característico, como escolas, hospital, casas para os operários e um ativo comércio. Inicialmente desenvolveu-se mais a área do burgo conhecida até hoje como Lapa de Baixo. Em 1915, por exemplo, essa parte do bairro já contava com uma ampla infra-estrutura, como água encanada, esgoto e iluminação pública.

A “parte alta” da Lapa desenvolveria-se mais a partir da década de 1920, com a chegada do bonde elétrico a região, com linhas que saiam do centro paulistano até a região da rua Guaicurus e adjacências.

Muitas empresas estabeleceram-se na Lapa, que nunca mais parou de se desenvolver. Chegaram empresas como a Santa Marina, Swift Armour, a Fábrica de Cigarros Alfredo Fantini, o Café Santa Efigênia (com E mesmo, diferente do bairro que e com i), Pincéis Tigre etc.

Estação da Lapa em 1979

No decorrer do século 20, especialmente a partir dos anos 1970, o bairro passou a perder o viés industrial, com fuga de empresas para outros municípios e estados, num processo bastante similar ao ocorrido no Brás, Belenzinho, Mooca e Ipiranga.

Casario operário da Lapa de Baixo, anos 1960 (clique para ampliar)

Atualmente a Lapa transforma-se cada vez mais em um bairro residencial e de serviços. Regiões como Vila Leopoldina e Vila Anastácio (esta última principalmente), perdem seus galpões industriais para novos e altos arranha-céus, quase todos residenciais.

É a transição contínua de uma região efervescente, na cidade que não para jamais.

O grande desafio da municipalidade é devolver a Lapa de baixo o protagonismo do passado, não permitindo a demolição desenfreada da memória fabril e do casario antigo da região, que é rica em cultura e tradição.

Casa na rua Engenheiro Fox em foto de 1979 (clique para ampliar)

Um futuro promissor para o bairro seria a transformação dos inúmeros galpões do bairro em estúdios de cinema e televisão. O facilitador para isso existe desde 2015, com a criação, pela prefeitura, da Empresa de Cinema e Audiovisual de São Paulo, a SPCine.

O nome Grão Burgo da Lapa era bastante pomposo e não caiu muito no gosto da população. Além da grande maioria sempre chamar o bairro apenas de Lapa ou usando o complemento “de cima” ou “de baixo”, até os anos 1910 ainda encontrava-se o nome parcialmente, como Burgo da Lapa, em publicações oficiais veiculadas nos jornais da cidade. Com o tempo o burgo foi esquecido completamente.

Mas São Paulo ainda tem um bairro que leva o termo. É o bairro de Burgo Paulista na zona leste de São Paulo, próximo do simpático Jardim Três Marias. Mas isso é assunto para outra reportagem…

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