O dia de domingo em Bananal, extremo leste do Estado de São Paulo, prometia. O sol estava escaldante e a ladeira que ligava o centro histórico desta aprazível cidade ao nosso destino não era fácil de se vencer. Mesmo assim, enfrentamos a desanimadora subida como que se escalássemos um dos vários morros da maravilhosa Serra da Bocaina que envolve a cidade.
Ao chegar no topo, além do cansaço deste escriba fora de forma, nos deparamos com um ótimo lugar do para se alegrar e se deprimir. Se por um lado o verde das montanhas mistura-se com o azul encantador do céu, do outro lado ficamos chocados ao observar um osso humano, branco como a cor das nuvens, esquecido repousando ao chão, próximo de uma sepultura destruída.
O local em questão é o Cemitério Bom Jesus, ou simplesmente Cemitério do Alto como é mais conhecido naquela cidade.
Construído no final da primeira metade do século 19, o Cemitério Bom Jesus foi a primeira necrópole de Bananal. No local há sepulturas cuja idade se quase confundem com a idade do Brasil independente. O local serviu de última morada para muita gente da região até o final do mesmo século, quando um outro cemitério, próximo à Santa Casa de Misericórdia foi criado. Mesmo assim, nunca parou de receber mortos, mesmo que em menor escala.
Ao subir na parte mais alta do cemitério, temos uma visão desoladora do que era para ser um local de paz e respeito.
O descampado que abriga o velho cemitério apresenta quase a totalidade de seus túmulos completa ou parcialmente destruídos. Alguns deles com as entranhas das sepulturas abertas. Chega-se ao cúmulo de que alguns jazigos estarem parte no chão, parte suspensa, como que se sustentadas por algum milagre divino (ver próxima foto).
Local foi alvo de bombardeio em 1932 ?
Algumas pessoas mais antigas da cidade com que conversamos, afirmam que este cemitério está nesta situação ao menos desde 1932.
De acordo com o depoimento deles o cemitério foi bombardeado por aviões leais ao governo federal durante combates da Revolução Constitucionalista ocorrido naquele ano. Eles continuam explicando que em uma colina muito próxima a esta onde há o cemitério, havia uma trincheira de paulistas e que os aviões das tropas federais teriam errado a mira, acertando e destruindo parcialmente, o cemitério. O resto da destruição do local o descaso e o tempo entraram em ação.
Segundo a pesquisadora local e vice-presidente do IPHAR (Instituto de Pesquisa Histórica e Ambiental Regional), Maíra Cheminand, a hipótese não pode ser descartada mas ainda são necessários estudos para comprovar que o local foi realmente bombardeado em 1932.
Ela também critica o fato de que apenas o centro histórico de Bananal é tombado como patrimônio histórico, o que poderia também ser estendido ao Cemitério Bom Jesus, que é parte integrante da história da cidade. Enquanto nada é feito para preservar o local, túmulos, cruzes e os tradicionais “berços de ferro” que adornavam as sepulturas mais antigas vão se estragando a céu aberto.
Apesar do aspecto de abandonado, o cemitério não está desativado. De acordo com Maíra Cheminand o local ainda recebe alguns sepultamentos. Apesar disso o cemitério, que pertence à Igreja Católica, não recebe qualquer atenção seja por parte dos religiosos, seja das autoridades municipais.
Um descaso antigo e um profundo desrespeito com a memória daqueles que há muito já partiram, não importando se quem está ali sepultado seja uma figura importante ou um desconhecido. Cabe ao ministério público local tomar uma providência, antes que seja tarde demais.
Nossos sinceros agradecimentos a Ludmila Fuzzi, Maíra Cheminand e ao IPHAR, instituto que desenvolve um excelente trabalho na região, e que colaboraram com a nossa reportagem.
Confira nossa galeria com outras 12 imagens do Cemitério Bom Jesus (clique na foto para ampliar):
Conheça outro cemitério abandonado:
* Cemitério Nossa Senhora do Carmo – Mogi das Cruzes