Certamente, já ouvimos falar sobre a Semana de Arte Moderna de 1922 que abriu segmento não apenas para artes visuais, mas também para o teatro, e principalmente para a arquitetura. Esta semana (de apenas três dias) mudou radicalmente a cultura, os costumes e o cotidiano da cidade.
Um exemplo de arquitetura modernista está no tradicional bairro do Pacaembu. Ali, na rua Itápolis, a casa projetada em 1930 por Gregori Warchavchik é considerada o marco de renovação arquitetônica de São Paulo. Um resquício da história da arquitetura modernista que ainda continua viva.
Enraizada na Alameda Lorena esquina com a Rua Ministro Rocha Azevedo, sobrevive a Vila Modernista. Uma vila que resiste, mesmo descaracterizada, em meio ao caos urbano.
Construída entre 1936 e 1938 pelo renomado arquiteto, o multicultural, Flávio de Carvalho, a Vila Modernista possuía dezesseis casas, uma diferente da outra. Quatro casas na Rua Ministro Rocha de Azevedo, mais quatro na Alameda Lorena, uma maior que ficava na esquina das ruas e outras setes em uma rua particular aos fundos da Alameda Lorena.
Para mostrar a diversidade das casas, Flávio de Carvalho elaborou um manual de instruções visando a exploração para aguçar a percepção da facilidade de uso de cada casa, uma vez que os móveis eram fixos, de alvenaria.
Também dava dicas de como usar as cortinas. Dicas simples, mas o arquiteto estava educando os novos moradores em uma cidade que estava crescendo rapidamente.
A princípio, a vila não agradou aos olhos da maioria da população, mas ela acabou virando um sucesso perante aos intelectuais e artistas, seus primeiros inquilinos. O tempo passou, a cidade se expandiu, e o que era para ser um marco na história da arquitetura paulistana acabou ficando sufocado e as descaracterizações começaram.
Das quatro casas situadas na Alameda Lorena, três estão completamente descaracterizadas e apenas uma sobrevive ao projeto original. A maior casa da vila, que se encontrava na esquina, foi demolida dando lugar a um prédio.
Finalizando o banho de sangue, todas as casas situadas na Ministro Rocha de Azevedo, estão irreconhecíveis. As sete casas da Rua Particular conseguem sobreviver com vitrines, em vez de janelas.
A Vila Modernista está perdendo o seu charme e o seu valor histórico gradativamente, passando despercebida em meio à correria paulistana.
O então arquiteto a projetou tendo como ideal “educar os novos moradores para a sociedade”. Será que precisamos multiplicar as Vilas Modernistas em São Paulo?
Confira outras fotos da Vila Modernista de Flávio de Carvalho (clique para ampliar):
Crédito da planta (croqui) da Vila Modernista: Prof. Mestra Carolina Pierrotti Rossetti (Arquiteta USP/São Carlos)
Respostas de 35
Muito interessante o artigo, desconhecia a história da Vila Modernista. Uma pena que apenas um imóvel preservou a sua originalidade.
Multicultural,sim. Flávio de Carvalho criou polêmica ao desfilar pela rua Barão de Itapetininga, trajando saias curtas e uma blusa feminina, há 55 anos.
Eu já vi uns moleques usando kilt na rua só para aparecer, mas blusa feminina se algum homem usar ainda vai ser malvisto.
Arquitetura feia e sem graça, como toda arquitetura modernista. Enfim, tem gente que gosta, fazer o que?
Peço vênia para discordar. A arquitetura modernista pruduziu belos edifícios. Pense em Warchavchik e no próprio Flavio de Carvalho… Esses sobrados são muito interessantes e o projeto é bem amarrado. O que me chocou nesta matéria foi o que fizeram com algumas das casas. O que é aquele telhadinho da que virou farmácia? E aqueles gradis de ferro fundido cheios de requififes nos terraços de outra? E aquele monte de janelinhas da loja de tintas? Definitivamente falta ao paulistano médio a cultura para reconhecer e preservar
Opa, texto com problemas… Corrigindo: é produziu, não “pruduziu”. E a última frase foi incompleta. Lá vai:
Definitivamente falta ao paulistano médio a cultura para reconhecer e preservar uma casa com projeto de qualidade e valor histórico e arquitetônico.
Juliana, pensei que o problema era no artigo! Fiquei louco que não achava… rsrs
Que nada, Douglas, o artigo está perfeito. Adorei.
Muuuito interessante !
Discordando um pouco do colega, uma arquitetura encantadora, principalmente considerando o ano em que foi construída. Evidentemente estava à frente do seu tempo – por isso a maioria das pessoas não entendeu. Não por acaso, artistas e intelectuais gostaram – pois normalmente estão mais “antenados”. Uma história interessante.
Boa noite.
Parte da destruição da arquitetura de São Paulo começou com esse “modernismo” que dizia que Ramos de Azevedo ( maior arquiteto brasileiro) e seus colegas eram estrangeiros, ao invés de reconhecer que era uma arquitetura paulista, com influências de outros lugares.
Promove-se então uma destruição dessa arquitetura e em sua lugar coloca-se obras modernistas, que aliás, não combinam com a cidade, é algo imposto…
Obrigado.
Ugo, concordo com você. E acho que Ramos de Azevedo trazia uma arquitetura paulistana, mas tardia (o que ele trazia já não era mais feito na Europa).
Mesmo assim, era belíssimo.
A “verdadeira arquitetura paulistana” não seria a bandeirante? Que comentário caricato dizer que o modernismo não combina com São Paulo… Só existe boa arquitetura e não-arquitetura. A Europa soube preservar diferentes idades das cidades, é isso que precisamos aprender.
Só discordo quando diz que não combina com a cidade, afinal, o que não combina com a cidade? São Paulo é multicultural e multifuncional. A maioria da arquitetura feita por Ramos de Azevedo está preservada, muito mais do que outras. Mas, nem esta arquitetura modernista é preservada da nossa ignorância cultural e histórica. É um Karma da cidade. Creio que deveria se restaurar a vila inteira, conforme o original.
Que maravilha esse projeto, parece que estamos diante de uma vila da Bauhaus do anos 20/30.
Pelo menos a casa mais original poderia ser tombada não é?
Eu não me importo se arquitetura é o ecletismo de Ramos de Azevedo, o modernismo de Flávio de Carvalho ou os deliciosos terraços hollywoodianos de Artacho Jurado. Importa que a arquitetura seja coerente e que o projeto tenha qualidade estética. O que me encanta em SP é justamente essa diversidade de estilos, que produziu edifícios muito diferentes entre si, de formas e épocas distintas, mas funcionais e de grande beleza – e que na maior parte das vezes convivem em harmonia e encantam os olhos.
Na minha singela opinião,acho que independente de ser modernista ou não,a historia deveria ser preservada.Para isso precisamos das casas com seu estilo original.
Usar este artigo para fazer ataque genérico a este ou aquele estilo arquitetônico é de uma insensibilidade que condiz totalmente com a mentalidade do trágico empreendedor paulistano – que destrói seus próprios tesouros culturais sem perceber, porque não os reconhece em primeiro lugar e também por estar demasiado ocupado a saciar a sua voracidade do dia, sem qualquer perspectiva de valor projetado no tempo. São Paulo ainda vai se demolir e reconstruir mais feia, muitas vezes, mas no momento não sei bem o que conseguirá ser mais feio do que aquilo que hoje domina a paisagem da cidade.
a casa que está original é lindíssima!quem achou sem graça é porque não tem o mínimo de criatividade. estas casas eram muito criativas.tem um visual limpo e moderno mesmo para os dias de hoje.
Toda vez que posso por ali me emociono. Simplesmente gosto e gosto muito. Parabéns à Gláucia por escrever sobre o tema e fotografar.
Como disse o Gustavo Moreira a vila é Bauhaus puro.
Os trabalhos de Gropius e colegas estão tôdos preservados em Jena , Weimar e Berlin. Lá não se permitiu que fossem transformados em farmacias e lojas de tinta.
Deformaram os prédios pra ficar algo mais convencional, fácil de entender. Alguns desses predios poderiam ser facilmente restaurados para a forma original.
Pela ousadia de Flávio de Carvalho, que é pouco conhecida, esses prédios devem recuperar a forma original.
Eu moro em Valinhos, cidade onde Flavio de Carvalho construiu sua casa no início dos anos 30, na Fazenda Capuava, bem ao seu estilo, moderno. Pensei que era só no interior que a arquitetura se descaracterizasse assim, mas agora vejo que em São Paulo isso também acontece. Uma pena.
Um tempo atrás recuperaram umas casas do Le Corbusier na França que já estavam bastante alteradas. Acho que pela importância do Flávio de Carvalho poderiamos fazer o mesmo. Mas seria nescessária uma campanha pra gerar comoção em torno da proposta.
Como alguem disse aí acima o problema é a escassa formação cultural do nosso povo. Pela maioria se estaria no maximo construindo aquelas casas de estilo
Manuelino tão ao gosto dos nossos ricos nos anos 40/50.
Excelente matéria, deu gosto de ler.
Eu não sabia que com a Semana da Arte Moderna fizeram a Vila Modernista.
Não gosto muito da arquitetura moderna(na verdade, não gosto de nada do Modernismo) mas, essas casas foram bem interessante. É horrível que as tenham destruído dessa forma… Talvez seja por causa dessa destruição que eu, e provavelmente muitos outros, desconheciam o projeto.
A culpa não é das pessoas, dos empresários ou seja lá o que for. Parem com essa jossa. O que faltou aí foi fiscalização do poder público. O problema é que ignoramos o presente e costumamos não dar importância histórica ao que fazemos hoje. Daqui há pouco você vai ver gente reclamando das construções do saudoso ano 2000 que foram destruídas. Tudo mesma coisa.
As plantas dessa vila modernista estão no Arquivo Histórico Municipal.
“Erguida em 1938, vila modernista nos Jardins pode agora desaparecer de vez”: https://www.instapaper.com/read/983181191
Mas a data é de 2017 e a vila já está bem descaracterizada.
Sensacional. Entrei em uma casa assim, onde se localizava o Estúdio Cameratti, no Bairro Jardim, em Santo André – SP. Os boatos eram que o imóvel havia pertencido ao artista Zé Rodrix, mas depois foram desmentidos. Um dos donos do Estúdio Cameratti foi o cantor Belchior. Infelizmente, como é de praxe neste país subdesenvolvido, sobretudo culturalmente, a casa e o estúdio (o qual ficava nos fundos do terreno) foram demolidos, para dar lugar a um estacionamento. Só entrando na casa para ver como era moderna, também com os cantos arredondados, futurista e ao mesmo tempo aconchegante. Fica a saudade.
Eu li num livro que a “casa modernista” de Gregori Warchavchik era bem “simples”, sem os adornos de praxe da época, e isso propositalmente, claro, caso contrário, não seria modernista.
Acontece que, ao apresentar a planta na prefeitura, em 1927, ele teve que alegar falta de verbas para o acabamento vigentena época, para que as autoridades liberassem a casa para uso. Outros tempos…
. achei! fica no número 1057 da Alameda Min. Rocha Azevedo, Jardim Paulista. do mesmo jeito que nas fotos.