Casa São Nicolau

Num tempo em que o comércio era bastante pulverizado e não existiam os “shopping centers” nem as grandes redes de lojas, o centro de São Paulo era repleto de estabelecimentos dos mais diferentes ramos.

Muitas delas foram abertas por ex-funcionários de lojas e importadoras mais antigas, como é o caso da Casa São Nicolau.

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Esta loja foi aberta pelo português Júlio Moura Coutinho d’Almeida d’Eça, que chegou ao Brasil no início do século XX e, aos 16 anos, foi trabalhar numa fazenda, provavelmente na área administrativa, uma vez que dois anos depois, já em São Paulo, era gerente de seção na conhecida Casa Fuchs, fundada em 1855 e que era em 1913, já na Rua São Bento, um grande armazém que vendia, entre outras coisas, roupas, móveis, malas e objetos decorativos. Nesta época, contava com 40 empregados a loja onde, entre eles, figurava Júlio d’Eça.

Na foto publicidade da Casa Fuchs, onde Júlio d’Eça trabalhou

Na década de 1920, Júlio sai da Casa Fuchs e abre seu próprio negócio, que, no início de sua existência e apenas por um ano, se chamou “Casa Papai Noel”, quando utilizaram um espaço alugado na Rua Líbero Badaró para não perderem o movimento de Natal, enquanto a loja da Praça do Patriarca estava em reforma.

Já com a denominação “Casa São Nicolau”, em referência à tradição de Saint Nicholas*, se estabelece na Praça do Patriarca onde permaneceu até o encerramento de suas atividades.

Por volta de 1926, Júlio d’Eça (foto ao lado) se associa a um senhor chamado Hofstetter, que também havia sido gerente na Casa Fuchs. Mantiveram a denominação Casa São Nicolau, entretanto a razão social passou a ser “Hofstetter, Eça e Cia.”, que perdurou até que Hofstetter ficasse doente e vendesse sua participação ficando Júlio com 100% da empresa.

Na foto: Júlio d'Eça

A Casa São Nicolau cresceu e chegou a ocupar o térreo, o subsolo e o primeiro andar de uma loja na Praça do Patriarca onde mantinha um time de empregados sempre muito alinhados.

É possível observar a foto, onde, ao centro, o orgulhoso Júlio d’Eça – com suas elegantes polainas – está cercado por seus funcionários. O capricho ia aos detalhes, como é possível notar no impecável uniforme do office boy (canto direito) onde se lê no colarinho Casa São Nicolau. Outros tempos…

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A concorrência não era pequena, ainda mais num espaço tão reduzido como o conhecido triângulo do centro de São Paulo. Na década de 1930, atuando no mesmo ramo de variedades, estavam presentes a Casa Fuchs, a Mestre e Blatgé (depois de 1939 conhecida como Mesbla), a Ao Esporte Nacional, a Casa Casoy e o Mappin Stores. Neste cenário, a Casa São Nicolau aparecia como “A mais completa collecção de brinquedos, artigos esportivos, jogos e passatempos, combinados especialmente para a época” conforme publicado na revista A Cigarra.

Entrada da Casa São Nicolau (clique na foto para ampliar)

O sortimento de mercadorias era enorme, conforme mostram as fotos com prataria portuguesa, joalheria, malas, bolsas, pastas, calçados e até confecção de roupas para caça, pesca e montaria. Tudo isso também poderia ser comprado por catálogo que era enviado gratuitamente para os interessados, que comprariam produtos de uma loja onde “Nossa mercadoria não custa. Vale!” conforme propaganda de época.

Anúncio de 1928 veiculado nos jornais paulistanos

O grande atrativo eram os brinquedos, com Julio d’Eça trazendo as novidades da Alemanha, com destaque para os trens elétricos Märklin que, em movimento, faziam a alegria da criançada (e, por que não, dos adultos) nas amplas vitrines da loja recém-reformada. Consta que teria, inclusive, sido convidado na formação da Brinquedos Estrela, mas, duvidando da qualidade que poderiam ter os produtos, acabou não entrando na sociedade.

Na foto, brinquedos à venda expostos na vitrine da loja

A Casa São Nicolau funcionou até meados da década de 1970, quando encerrou suas atividades no centro de uma São Paulo, onde a frequência já era muito diferente dos tempos passados.

publicidade da Casa Nicolau veiculada na década de 1970

NOTA: O verdadeiro Papai Noel
São Nicolau de Mira (*15/03/270 +06/12/350), dito Taumaturgo, também conhecido como São Nicolau de Bari, é o santo padroeiro da Rússia, Grécia e da Noruega. É o patrono dos guardas noturnos na Armênia e dos coroinhas na cidade de Bari, na Itália, onde estariam sepultados seus restos mortais. Devido à sua imensa generosidade e aos milagres que lhe foram atribuídos, foi canonizado pela Igreja Católica e tornou-se um símbolo ligado diretamente ao nascimento do Menino Jesus. São Nicolau é considerado um dos santos mais conhecidos da cristandade.

Fontes consultadas e bibliografia:
. Relato oral de Cristina Maspes, neta de Victorio Maspes
. A Cidade Exposição – Barbuy, Heloisa – Edusp, 2006
. Wikipedia – Dia de São Nicolau – Link visitado em 01/04/2020

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23 respostas

  1. Casa São Nicolau ! Cheguei a comprar coisas lá. Se não me engano, deve ter fechado em 1975 ou 1976. Estou velho mesmo !

  2. O imóvel ainda existe? Por outro lado, lembro-me de que, antes do Natal, na Alemanha, Holanda e Bélgica se faz a comemoração do Dia de São Nicolau todo dia 6 de dezembro, e a figura dele é muito especial.

    1. O Edifício Lutetia, de propriedade da FAAP, foi projetado por Ramos de Azevedo e construído na década de 20. Exemplo marcante da arquitetura que predominou no centro paulistano na primeira metade do século XX, o prédio é um símbolo histórico. Em 1992 foi tombado pelo Conselho Municipal de Preservação – CONPRESP (Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da Cidade de São Paulo).

  3. Nasci em 1950 e ganhei muitos brinquedos da Casa São Nicolau!Foi bom reviver através do artigo!Obrigado pela homenagem ao estabelecimento mas extensiva àqueles que tiveram a sorte de viver essa época!

  4. Outro ícone do tempo em que o centro concentrava as lojas mais sofisticadas da cidade e que hoje jaz no limbo da história e na memória dos que a conheceram.

  5. Amei ! Tenho a sensação de ter vivido essa época! Sera que nossa memória tem genes memória ? kkkk Saudades ? mas como ? Historias ouvidas , deve ser isso .

  6. Gosto muito de ler sobre a história e nosso passado recente. Este artigo é muito interessante e penso que o cotidiano do século passado pode nos mostrar como nossos pais e avós viveram. Grata surpresa este artigo.

  7. Muito interessante essa história da casa de brinquedo São Nicolau, eu por exemplo ganhei um brinquedo do meu pai quando eu tinha 5 anos, uma abelhinha!!! Até hoje está comigo, ela tem 48 anos, e tem um pequeno adesivo com o nome são Nicolau. abçs Francisco de São Paulo.

    1. Parabéns pelo artigo ! Conheci o sr Júlio quando criança ! Era uma pessoa incrível ! Era pai do meu tio Francisco , casado com a irmã da minha avó
      Fizeram parte da história e do comércio de SP
      Lindas lembranças ! Bons tempos !

  8. Ola José, foi com muita alegria q li o seu artigo. Eu sou neta do Júlio, filha do Francisco, o filho mais velho. Gostaria muito de conversar com vc é saber mais detalhes desta história toda. Você tem mais fotos ? Quando a loja foi vendida em 1972, nos mudamos para o interior do estado, e infelizmente meu avô morreu antes q eu tivesse tempo de ter sentado com ele para ouvir suas histórias ( ele era um homem muito reservado). Hoje moro em Londres, meu pai faleceu em 2005.
    Se vc puder entrar em contato comigo, eu ficarei imensamente grata.
    Um forte abraço,
    Patricia d’Eça

  9. Muito bom o artigo! O Júlio d’Eça era meu bisavô, muito interessante ler um pouco sobre sua história. Meu avô Francisco d’Eça trabalho na loja como gerente.

  10. Corrigindo o outro comentário, meu avô era o responsável pela loja depois que meu bisavô se aposentou .

  11. Nos anos 50 no Natal ia com meus pais na cidade ver os enfeites das ruas e lojas e adorava a Casa São Nicolau pois eles montavam presépio mecânico na vitrine e um trenzinho que passeava em todo teto da loja, ficava boqueaberto….

  12. Registro historico muito bom ! Era a principal loja de brinquedos de São Paulo, minha mae comprou um projetor de brinquedo chamado Cine Barlam que era diversão garantida para mim , meu irmãos e nossos colegas.
    Este produto até existe a venda no Mercado Livre , se quiser consultar. Era um dos mais vendidos.

  13. Já como Casa São Nicolau, suas vitrines faziam o encanto da garotada pela beleza e quantidade de brinquedos expostos. Nos anos 40, em minha infância, era visita obrigatória em vésperas do Natal.

  14. Sou neta de Carlos Pedro Guilherme Zwarg. Ele trabalhou muitos anos com o Sr. Eça, como ouvi a história da minha mãe. Ele consertava os brinquedos que eram importados da Alemanha. Muito bom o relato e fotos.

  15. Tive a honra de trabalhar nas casas vermelhas que na década de 80 administrava a “Casa São Nicolau ‘

  16. Sou neto de Manoel Joaquim Gonçalves, que foi proprietário da Casa Fuchs. Quando menino, morando em Pinhal (SP), o momento mais feliz era quando vínhamos passear na capital , na época do Natal, quando éramos levados para ver as vitrines da Casa Fuchs. Obrigado, por essa linda viagem no tempo.

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